Judô
Mundial de Judô 2019
Três chances de bronze se tornam três quintos lugares entre os pesados no Mundial
Antes das lutas da noite, o último dia de competições no Mundial de Tóquio, no Japão, se desenhava potencialmente como o melhor da seleção brasileira nos sete dias de lutas no Nippon Budokan. Os quatro atletas do país estavam vivos no bloco final. Maria Suelen Altheman disputaria a semifinal. Rafael Silva, David Moura e Beatriz Souza chegaram à repescagem com condições de brigar pelo bronze.
As quatro possibilidades, no entanto, acabaram não se concretizando e o país saiu com três quintas colocações. Com isso, o Brasil encerra a competição individual do Mundial com duas medalhas de bronze, conquistadas por Mayra Aguiar na categoria -78kg e por Rafaela Silva na categoria -57kg. Em 2018, no Mundial de Baku, o Brasil subiu ao pódio uma vez, com Érika Miranda, na categoria -52kg.
Na reta final da competição dos pesados, Maria Suelen teve dois combates muito complicados, contra a número 1 e a número dois do mundo. Na semifinal, pegou a cubana Idalys Ortiz, que tem uma medalha olímpica de cada cor e um bicampeonato mundial no currículo. Mais do que o histórico, pesava o confronto direto. Suelen lutou 16 vezes antes de Tóquio com Idalys no circuito. Perdeu todas. Desta vez esteve perto. Levou o confronto para o Golden Score, mas acabou superada no solo.
"Independentemente do resultado, consegui fazer o que estava treinando. Alguns golpes entraram bem e superei uma chave difícil. Ano passado fui quinto. Este ano também. É sempre bom estar pontuando bem no ranking para as Olimpíadas"
Maria Suelen
"Sempre quando entro com ela faço táticas diferentes. Nos últimos tempos, a luta tem sempre seguido para o Golden Score. Acho que é algo mais tático. Ela espera muito. Uma luta para ver, rever, pegar alguém com o biotipo parecido para fazer o treinamento para as próximas. Mas fora ela tem várias outras complicadas", comentou Suelen, que na sequência, na disputa do bronze, foi vencida pela japonesa Sarah Asahina, número dois do mundo e campeã do Mundial de 2018. Na final, o título ficou com a outra japonesa na chave, Akira Sone, que venceu a cubana Idalys no Golden Score.
"Independentemente do resultado, consegui fazer o que estava treinando. Alguns golpes entraram bem e superei uma chave muito difícil. É o último Mundial antes das Olimpíadas. Ainda não sabemos as atletas do Japão e do Brasil. Ano passado fui quinto. Este ano também quinto. É sempre bom estar pontuando", comentou Suelen, que tem uma briga particular pela vaga olímpica do país na categoria com Beatriz Souza. "A Bia também fez uma ótima competição. Fico feliz. Somos do mesmo clube. Uma motiva a outra. Ainda tem quase um ano e muitas competições por vir", comentou.
Com duas pratas em edições anteriores do Mundial, Maria Suelen, teve uma campanha consistente antes da semifinal. Estreou na segunda rodada, contra a chinesa Yan Wang, de 25 anos, e venceu por ippon. Em seguida, a brasileira de 31 anos enfrentou Melissa Mojica, de Porto Rico, de 35 anos, e passou adiante novamente por ippon. Nas quartas de final, superou Iryna Kindzerska, do Azerbaijão, por imobilização.
O joelho no caminho de Bia
Beatriz Souza viveu o drama de uma lesão na hora mais imprópria de sua carreira. Depois de uma bela caminhada na competição, a atleta de 23 anos chegou à disputa do bronze contra Kayra Sayit, da Turquia. Na primeira tentativa de entrada das duas, contudo, Bia sentiu o joelho direito. Uma lesão que após a luta seria diagnosticada previamente como uma entorse muscular. A brasileira, número nove do mundo, ainda tentou seguir no combate, mas tinha grande dificuldade para levantar cada vez que as duas caíam no tatame, e ficou complicado se manter firme nas pegadas. Acabou sofrendo um ippon.
"Eu já vinha com o joelho machucado e dei uma sentida maior naquela queda, na luta. Agora é voltar para o Brasil e fazer todos os exames direitinho e retornar ainda mais forte. Eu estava bem preparada. Venho de uma constância forte em campeonatos, mas acontece. Judô é isso. Agora é tratar e seguir em frente", lamentou Bia. "Conversei com os médicos. Estou mais calma. Não adianta se desesperar por algo que não vou resolver imediatamente", comentou.
Antes da disputa do bronze, Beatriz Souza estreou bem, com ippon, contra a americana Nina Cutro-Kelly, em luta válida já pela segunda rodada. Na sequência, passou pela húngara Mercedesz Szigetvari e chegou às quartas de final. Aí teve pela frente a mesma pedra no sapato de Maria Suelen: Idalys Ortiz. Bia, que tem no currículo uma vitória contra a cubana, fez uma luta igual e impôs dificuldades, mas acabou imobilizada e foi para a repescagem. Na luta que valia ao vencedor o direito da disputa pelo bronze, superou Iryna Kindzerska, do Azerbaijão.
Quase lá também no masculino
"Agora é degrau por degrau até os Jogos Olímpicos. Ainda tem essa grande briga nacional pela vaga. Estou feliz com o resultado aqui por conta da lesão recente, mas com a sensação de que poderia ter brigado pelas primeiras posições"
Rafael Silva
Dono de dois bronzes e uma prata em mundiais e dois bronzes olímpicos, Rafael Silva foi outro que saiu de Tóquio com a sensação de um quase lá. Baby vem de uma cirurgia no pulso esquerdo há menos de três meses. Segundo o atleta, não há mais dores, mas a força para as pegadas ainda não é a mesma. Nas quartas de final, ele foi superado pelo japonês Hisayoshi Harasawa e, na disputa do bronze, levou um ippon no Golden Score do sul-coreano Minjong Kim.
"Essa última foi uma luta difícil. Ter voltado de lesão foi bem complicado. Está faltando um pouquinho de força na mão ainda. De qualquer forma, acho que fiz um bom combate. Hoje o limite dele estava além do meu e por isso ele foi merecedor de conquistar a medalha", avaliou. "Agora é me preparar para as próximas competições. Degrau por degrau até os Jogos Olímpicos. Ainda tem essa grande briga nacional pela vaga. Estou feliz com o resultado por conta da lesão, mas com a sensação de que poderia ter brigado pelas primeiras posições", completou Baby.
Rafael Silva disputa com David Moura a vaga aos Jogos de Tóquio, em 2020. Cada país tem direito a levar apenas um atleta por peso. A decisão da Confederação Brasileira de Judô será anunciada em maio de 2020, e um dos critérios decisivos para determinar a seleção será o ranking mundial. Hoje Rafael é o quinto colocado. David, o terceiro. Nas duas edições anteriores dos Jogos Olímpicos, em Londres (2012) e Rio de Janeiro (2016), Rafael Silva foi o representante nacional. Conquistou o bronze nas duas ocasiões.
A caminho do brasileiro antes da disputa da medalha foi consistente. Na estreia superou Harun Sadikovic, de Bósnia e Herzegovina, por ippon, e na sequência passou pelo romeno Vladut Simionescu. Na decisão pela vaga na semifinal, esbarrou no japonês Harasawa, número quatro do mundo, medalhista em três etapas do Grand Prix em 2019 e que ficaria com a prata em Tóquio. A luta foi amarrada, dura, sem entradas consistentes. Rafael foi sendo vencido pelo cansaço. No Golden Score, o japonês saiu vencedor nas punições. Baby recebeu a terceira, que encerrou a luta, por falta de combatividade. Na luta pelo direito de disputar o bronze em Tóquio, Rafael teve pela frente o holandês Henk Grol, de 34 anos, décimo do ranking mundial. O brasileiro conseguiu impor seu jogo de força e intensidade e encaixou um ippon no holandês.
David em sétimo
David Silva teve uma história semelhante à de Baby na chave. Venceu os dois primeiros confrontos, contra Rakan Zaidan, da Arábia Saudita, e sobre Vito Dragid, da Eslovênia, mas acabou levando um ippon do sul-coreano Minjong Kim quando vencia a luta com a vantagem de um waza-ari. Na luta pelo direito a disputar o bronze, também encarou um holandês, Roy Meyer, de 28 anos e número oito do mundo. Diferentemente de Rafael, contudo, David foi vítima de uma imobilização no fim do tempo normal da luta e acabou ficando fora da disputa por medalhas, em sétimo lugar.
"Eu tento sempre olhar o lado positivo, mesmo agora, quando estou bravo. Foram quatro lutas em altíssimo nível. Qualquer detalhe, quem erra paga o preço. Foi o que aconteceu hoje, tanto contra o coreano quanto nessa com o holandês. É uma pena porque nessa última entrei bem, com a cabeça certa, fazendo o judô que quero. Essas coisas a gente tem que digerir", comentou David Moura.
Japão, França e Portugal em destaque
No quadro final de medalhas do Mundial de Judô de Tóquio, Japão e França foram os países de maior destaque. Anfitriões e donos da paternidade da modalidade, os japoneses conquistaram quatro ouros, seis pratas e cinco bronzes na competição. Um deles veio com a marca da sequência de uma grande hegemonia. Uta Abe, de apenas 19 anos, já é bicampeã mundial e saiu de Tóquio ostentando uma invencibilidade de 42 lutas, 27 delas vencidas por ippon. Outra jovem bicampeã mundial, ainda que não japonesa, foi a ucraniana Daria Bilodid, de 18 anos.
A França justificou a enorme tradição do país no judô e conquistou três ouros (todos no feminino), além de dois bronzes. Um dos ouros franceses deixou um gostinho amargo no Brasil. Madeleine Malonga, de 25 anos, derrotou Mayra Aguiar na semifinal antes de superar a então campeã mundial, Shori Hamada, para conquistar o título na categoria -78kg. "Quando ajustei o último ippon, pensei: Meu Deus, eu consegui. Fiquei sem palavras, mas muito orgulhosa desse dia. É um sonho realizado. Eu trabalhei por isso por muitos anos e confiei em minha habilidade", disse Malonga, entre muitas lágrimas de felicidade nas entrevistas assim que saiu do tatame.
Quem figurou como potência emergente na competição foi Portugal, em terceiro no quadro de medalhas, com um ouro e uma prata, cada um com histórias icônicas. A prata veio com Barbara Timo, na categoria -70kg. A atleta é de origem brasileira. Carioca, decidiu deixar o país depois de perder a corrida olímpica para os Jogos de 2016 contra Maria Portela. Mudou-se para Portugal para realizar o sonho de estar nos Jogos de Tóquio, em 2020. E fez uma competição brilhante. Caiu apenas na final, para a francesa Marie Eve Gahie, que havia sido vice-campeã na edição de 2018. "Em 2016 fiquei fora da Olimpíada. Não quero essa sensação de novo. Quero ser a número 1. Quero ser campeã olímpica. É um sonho que virou uma meta, um objetivo mais do que realizável", disse Barbara Timo.
A inédita medalha de ouro do judô português veio na categoria -100kg. Inédita para o país e inédita para Jorge Fonseca, de 26 anos, que nunca tinha conquistado o título de nenhuma etapa do circuito internacional da modalidade. O judoca quebrou o protocolo, fez uma dancinha no tatame e garantiu a pitada de humor que tirou um pouco da sisudez do torneio. "Estou feliz demais. Juro que não sei bem o que dizer. Acho que posso afirmar que não é uma surpresa para mim, porque me preparei demais, me dediquei demais, e sabia que um título viria alguma hora", disse.
"Acho que posso afirmar que não é uma surpresa para mim, porque me preparei demais, me dediquei demais, e sabia que um título viria alguma hora"
Jorge Fonseca, ouro na categoria -100kg, o primeiro título mundial de Portugal
Equipes mistas no tatame
No último dia de competições no Mundial de Judô, haverá a disputa por equipes mistas, formato que será adotado pela primeira vez em Olimpíadas nos Jogos do Tóquio, em 2020. Seis categorias de peso foram definidas pela Federação Internacional de Judô (IJF, na sigla em inglês) para serem incluídas na disputa. No feminino, -57kg, -70kg e +70kg. No masculino, -73kg, -90kg e +90kg.
Pelo regulamento, passa adiante o time que conseguir vencer quatro dos seis confrontos. Se houver um empate em 3 x 3, uma das categorias é sorteada para uma nova luta, que já começa no Golden Score.
Quinze seleções se inscreveram para o torneio. Pelo sorteio da chave, o Brasil estreia contra a equipe da Alemanha. Se vencer, terá pela frente o vencedor do confronto entre Portugal e Azerbaijão.
Além dos 18 atletas que disputaram a chave individual, o Brasil levou para Tóquio, especialmente para a disputa por equipes, mais quatro atletas. Tamires Crude e Ellen Santana no feminino. Jeferson Santos Jr. e Eduardo Barbosa no masculino.
Investimentos federais
Evento-teste para os Jogos Olímpicos de 2020, o Campeonato Mundial de Judô reuniu 839 atletas, de 148 países, em sete categorias de peso no masculino e sete no feminino. Na chave individual, o Brasil teve 18 atletas inscritos. Dezessete deles, como David Moura, Maria Suelen, Rafael Silva e Beatriz Souza, são integrantes do Bolsa Atleta, programa da Secretaria Especial do Esporte do Ministério da Cidadania. O investimento anual do governo federal no grupo é de R$ 1,67 milhão.
Além disso, 12 dos 18 atletas estão incluídos na Bolsa Pódio, a categoria mais alta do programa, voltada para esportistas que se consolidam entre os 20 melhores do mundo. Eles recebem repasses mensais que variam entre R$ 5 mil e R$ 15 mil. Numa outra frente de investimentos federais, 11 dos 18 atletas integram o Programa de Alto Rendimento das Forças Armadas (PAAR).
Gustavo Cunha, de Tóquio, no Japão - rededoesporte.gov.br