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Geral

11/11/2018 11h51

Madri 2018

Jaime Ruiz, o carateca que transformou fortes dores em um bronze no kata

Paulista de 52 anos, que toma oito remédios para suportar adversidades físicas, conquista o terceiro lugar entre os cadeirantes e fecha participação nacional no Mundial de caratê

Um palco exclusivo só para ele se apresentar, num ginásio com capacidade para 15 mil pessoas. Um Campeonato Mundial. Uma sequência de 118 movimentos por executar com precisão, foco e leveza no Kata sobre uma cadeira de rodas. Um adversário forte, o francês Fatah Sebbak, que já havia somado 42.7 pontos nas notas dos sete árbitros. Eram vários e inéditos os desafios do paulista Jaime Ruiz na decisão da medalha de bronze no último dia do Campeonato Mundial de Caratê, em Madri, neste domingo (11.11). Tanto que ele ficou nervoso, hesitante, com receio de não desempenhar bem.

Brasileiro durante a apresentação: 118 movimentos no kata. Foto: Abelardo Mendes Jr/rededoesporte.gov.br
"Saiu tudo encaixado. Consegui entrar concentrado, focado. Só pensava no kata. Nos movimentos. No que tinha de fazer"
Jaime Ruiz

"Eu tentei mostrar para ele que era uma competição a mais, como aquelas do bairro dele. Que não tinha essa magnitude toda, mas a verdade é que isso no Brasil nunca existiu. Nunca tivemos esse momento com tatame único, com silêncio prevalecendo, num ginásio desse tamanho", afirmou o técnico Ariel Longo.

A conversa prévia ajudou. "Saiu tudo encaixado. Consegui entrar concentrado, focado. Só pensava no kata. Nos movimentos. No que tinha de fazer", afirmou o brasileiro, que somou 43.9 pontos e conquistou o pódio inédito para o país na categoria de cadeirantes.

"São sete anos no caratê. E, nos últimos quatro meses, dedicação de segunda a sábado, três horas por dia. Minha vontade é demonstrar o caratê adaptado, não me mostrar", afirmou o carateca, que dedicou a medalha à esposa Nanci ("Ela é minha base") e ao seu técnico no Brasil, Sérgio Longo.

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Foto: Abelardo Mendes Jr/rededoesporte.gov.br

"Dentro das limitações dele, ele fez até mais do que poderia. Jaime não é um cara novo. Tem 52 anos. Geralmente os adversários são mais novos. Mesmo assim, a vontade é muito grande. O caratê é treinado de dentro para fora. Hoje ele colocou para fora o que tem de mais bonito", avaliou Ariel Longo.

No cotidiano, Jaime luta contra fortes dores, consequentes de uma hérnia de disco que pressionou as vértebras T11 e T 12 de sua coluna, lesionou a medula e causou paraplegia. "Hoje tenho uns remédios manipulados, mas já foram oito comprimidos por dia, para dar conta de dores lombares na região do glúteo. Para completar, tenho um desgaste na bacia que faz com que os ossos se toquem. Mas a dor não me afeta, não. Isso aqui vale todo o esforço", disse o atleta. Na disputa do ouro, uma briga egípcia. Abdelaziz Abouelnaga levou a melhor, com 45.2 pontos, contra 44.1 de Mohamed Allakany

Balanço

Ao todo, o Brasil subiu três vezes ao pódio na competição disputada no Wizink Center, na capital espanhola. Na final para deficientes visuais, Débora Knihs ficou com a prata na disputa diante da alemã Helga Balkie. A atleta ainda foi escolhida, numa votação popular, a melhor atleta deficiente visual do torneio, e levou o troféu de MVP.

Na categoria até 67kg masculino, Vinicius Figueira também conquistou a prata. Após vencer seis lutas nas rodadas eliminatórias, três delas contra adversários do top 20 mundial, o Brasil, segundo colocado no ranking, foi derrotado no detalhe, na decisão, pelo francês Steven Acosta, por 6 x 5.

Entre outros atletas sobre os quais havia expectativa, o Brasil teve performance tímida. Na categoria -55kg, a vice-campeã mundial e quarta colocada do ranking Valéria Kumizaki foi eliminada na estreia, pela sérvia Dina Durmis. "Eu estava me sentindo bem. A chave estava boa. Estava preparada, mas o golpe não encaixou", avaliou a brasileira.

O caratê é treinado de dentro para fora. Hoje ele colocou para fora e o que tem de mais bonito"
Ariel Longo, técnico da seleção paralímpica 

"A Valéria é uma mulher resiliente. Esse é o diferencial dela. Garanto que vai dar muita alegria para nós ainda. É uma pessoa que tem um comprometimento absurdo com o caratê. Foi campeã mundial júnior e de lá para cá só acumula excelentes resultados. Não nos preocupa o resultado, mas dar 'alimento' para ela, que se chama trabalho e treino", afirmou o técnico da seleção brasileira, Ricardo Aguiar.

Outro destaque da delegação era Douglas Brose. Bicampeão mundial na categoria até 60kg, o gaúcho não chegou ao torneio no melhor de sua condição física, técnica e tática. Ele sofreu uma lesão no tendão calcanho da perna esquerda na semifinal dos Jogos Sul-Americanos de Cochabamba, na Bolívia, em maio. Passou por cirurgia, fisioterapia, fortalecimento muscular, mas não teve tempo de chegar 100% a Madri. Foi eliminado na segunda rodada da chave, diante de Arrosyiid Rifky Ardiansyah, da Indonésia.

O técnico Ricardo Aguiar com Vinicius Figueira, prata na categoria -67kg. Foto: Abelardo Mendes Jr/rededoesporte.gov.br
"Claro que a gente queria melhor resultado. Eu como técnico, lógico que queria, mas é uma longa jornada até 2020"
Ricardo Aguiar, técnico da seleção brasileira de caratê

"Fiz tudo o que deu para fazer em um prazo curto, após uma lesão e uma cirurgia desse grau. A ideia agora é voltar para o Brasil e verificar o quanto esse 'acelerar a recuperação' pode ter interferido e o que preciso para ficar 100%", disse o atleta.

Para Ricardo Aguiar, o time nacional trouxe uma mescla de atletas experientes e um grande contingente da nova geração. Muitos estreando em Mundial. "Alguns correram o circuito internacional, outros menos, com apenas duas participações em etapas de Liga. Os mais novos vieram com uma condição diferente, e a maturidade influencia muito no caratê", argumentou o treinador.

"Claro que a gente queria melhor resultado. Eu como técnico, como coordenador, lógico que queria, mas é um início de uma longa jornada até 2020. Tem um lado positivo. O Brasil foi campeão do Pan recentemente na base. Temos peças de reposição. Já tem a etapa da China no próximo mês. Vamos ter lá três atletas que saíram recentemente da base. A ideia é essa. Alimentar o time principal. Ter os dois lados linkados. Essa transição é importante para a renovação", avaliou.

 

Galeria do Mundial de Caratê no Flickr do Ministério do Esporte: imagens disponíveis em alta resolução para uso editorial gratuito (crédito obrigatório: Abelardo Mendes Jr/ rededoesporte.gov.br)

Mundial de Caratê Madri 2018

 

Domínio japonês

No quadro de medalhas final do evento, o Japão reinou. Os anfitriões dos Jogos Olímpicos de 2020 somaram dez medalhas, com quatro ouros, quatro pratas e dois bronzes. Em segundo lugar ficou o Irã, com dois ouros, uma prata e quatro bronzes, com sete no total. A Espanha, que recebeu o torneio, também brilhou, com seis conquistas. O país ibérico levou um ouro, três pratas e dois bronzes. Confira abaixo todos os medalhistas do Campeonato Mundial.

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O japones Ryo Kiyuna conquistou o bicampeonato mundial no kata individual. Foto: Abelardo Mendes Jr/rededoesporte.gov.br

Resultados finais

FEMININO
KATA
Individual
1. Sandra Sanchez - Espanha
2. Kiyou Shimizu - Japão
3. Grace Lau Mo - Hong Kong

Equipe
1. Japão
2. Espanha
3. Itália
3. Turquia

KUMITE (lutas)
-50kg
1. Miho Miyahara - Japão
2. Serap Ozcelik - Turquia
3. Bettina Plank - Áustria
3. Sara Bahmanyar - Áustria

-55kg
1. Dorota Banaszczyk - Polônia
2. Jana Bitsch - Alemanha
3. Tzu-Yun Wan - Taiwan
3. Ivet Goranova - Bulgária

-61kg
1. Jovana Prekovic - Sérvia
2. Xiaoyan Yin - China
3. Btissam Sadini - Marrocos
3. Giana Lofty - Egito

-68kg
1. Irina Zaretska - Azerbaijão
2. Victoria Isaeva - Rússia
3. Lamya Matoub - Argélia
3. Miroslava Kopunova - Eslováquia

+68kg
1. Eleni Chatziliadou - Grécia
2. Ayumi Uekusa - Japão
3. Shymaa Abouel - Egito
3. Hana Antunovic - Suécia

Equipe
1. França
2. Japão
3. Espanha
3. Egito

Masculino
KATA
Individual
1. Ryo Kiyuna - Japão
2. Hugo Quintero - Espanha
3. Ali Sofuoglu - Turquia
3. Mattia Busato - Itália

Equipe
1. Japão
2. Espanha
3. Irã
3. Itália

KUMITE
-60kg
1. Angelo Crescenzo - Itália
2. Naoto Sago - Japão
3. Darkhan Assadilov - Cazaquistão
3. Abdessalam Ameknassi - Marrocos

-67kg
1. Steven Acosta - França
2. Vinicius Figueira - Brasil
3. Camilo Velozo - Chile
3. Hamoon Derafshipour - Irã

-75kg
1. Bahman Asgari - Irã
2. Luizi Busa - Itália
3. Ken Nishimura - Japão
3. Rafael Aghayev - Azerbaijão

-84kg
1. Ivan Kvesic - Croácia
2. Valerii Chobotar - Ucrânia
3. Zabiollah Poorshab - Irã
3. Ugur Aktas - Turquia

+84kg
1. Jonathan Horne - Alemanha
2. Sajad Ganjadeh - Irã
3. Babacar Seck - Espanha
3. Alparslan Yamanoglu - Turquia

Equipe
1. Irã
2. Turquia
3. Japão
3. Itália

PARALÍMPICO
Feminino
Deficientes visuais
1. Helga Balkie - Alemanha
2. Débora Knihs - Brasil
3. Alexandra Meteleva

Deficiência intelectual
1. Alaaeldin Ebrahim - Egito
2. Patricia Wright - Canadá
3. Natalie Olson - Canadá

Cadeirantes
1. Isabel Fernandez - Espanha
2. Marina Kulikova - Rússia
3. Alice Cavrioli - Itália

Masculino
Deficientes visuais
1. Yasushi Oba - Japão
2. Sahib Ahadov - Azerbaijão
3. Nicolai Bondarev - Moldávia

Deficiência intelectual
1. Antonio Gutierrez - Espanha
2. Manuel Prieto - Espanha
3. Carlos Huertas - Espanha

Cadeirantes
1. Abdelaziz Abouelnaga - Egito
2. Mohamed Allakany - Egito
3. Jaime Ruiz - Brasil

Gustavo Cunha, de Madri, na Espanha - rededoesporte.gov.br