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Badminton

09/10/2018 16h55

Buenos Aires 2018

Meninos do Piauí desafiam tradição e quase chegam às quartas no badminton

Descobertos em projeto social em Teresina, Fabrício Farias e Jaqueline Lima têm boas performances na Argentina e terminam na beira do grupo dos oito melhores

A conjugação de raquete e peteca não costuma rimar com tradição no Brasil. Esporte amplamente difundido na Ásia, o badminton ainda engatinha em nosso país. A quantidade de atletas nas categorias de base é ínfima perto das grandes potências do esporte. "Eu já vi peneira na Indonésia, em uma cidade, com 900 atletas. Dali saem 30. Todos os outros sabem jogar. Se viessem para o Brasil, ninguém ganhava. Para a gente falta isso, essa cultura enraizada. A raquete é vista com estranhamento, o nome ainda causa espanto", resumiu Norma Rodrigues, técnica da Seleção Brasileira, com a experiência de quem lida exclusivamente com a modalidade desde 2009.

A falta de cultura, contudo, não impede que uma safra de jovens atletas surja, em especial em projetos sociais que têm a modalidade como foco. Fabrício Farias e Jaqueline Lima são exemplos disso. Os dois representantes brasileiros nos Jogos Olímpicos da Juventude começaram a dar suas raquetadas em Teresina, cidade que se firmou como polo formador a partir de um projeto e se consolidou em torno de um Centro de Treinamento construído na capital piauiense.

Fabrício e Jaqueline nos Jogos da Juventude: mais um degrau na caminhada da modalidade. Fotos: Gustavo Cunha/rededoesporte.gov.br

"Tudo começou por volta de 2009, com uma sacada que a gente teve de colocar o badminton dentro do Segundo Tempo, do Ministério do Esporte. Começamos com cinco escolas municipais. Depois subiu para 15, para 18. Era um trabalho duas vezes por semana, duas horas por dia. Uma proposta lúdica. Mas tinha uns que terminavam a aula e ficavam, lá, na parede, treinando. Queriam mais. E surgiu a necessidade de ampliar, de montar um núcleo de treinamento de alto rendimento", explicou Norma.

"Cheguei perto do objetivo, que era sair do grupo, mas estou feliz porque tive resultados importantes e vou subir no ranking. Agora é continuar treinando para chegar mais longe"
Jaqueline Lima, badminton

Em Buenos Aires, a dupla piauiense, que já tem mais de dez anos de estrada, tinha uma tarefa inglória. A chave individual reunia os 32 melhores do mundo na categoria Sub-18. Os atletas foram divididos em grupos de quatro, mas só o primeiro de cada chave se classificava para as quartas de final. Jaqueline bateu na trave. Venceu a holandesa Madouc Linders por 2 sets a 0, passou pela australiana Zecily Fung por 2 sets a 1 e chegou à terceira rodada, nesta terça (09.10), para definir a primeira posição no grupo. A rival era Yinhsuan Huang, de Taipei. Não deu. Com quase 1,80m, Huang dominou o confronto e fechou em 2 sets a 0, com parciais de 21/9 e 21/15

"Foi difícil para mim. Estou triste porque perdi, mas é levantar a cabeça e seguir em frente, porque a vida também é feita de derrotas. A menina é bem mais alta, muito habilidosa, tem uma técnica boa. Foi bem difícil chegar na rede. Ela é rápida e me deslocou, colocou a peteca nos cantos da quadra", avaliou Jaqueline. "Cheguei perto do objetivo, que era sair da fase de grupos, mas estou feliz porque tive resultados importantes e vou subir no ranking. Agora é continuar treinando para chegar mais longe", avaliou a brasileira, atualmente a número 43 da listagem sub-18.

Treinos e intercâmbios

Integrante do programa Bolsa Atleta, do Ministério do Esporte, Jaqueline, de 17 anos, iniciou na modalidade aos nove. Tornou-se referência na escola, tanto por integrar a Seleção Brasileira como pelas oportunidades de rodar o mundo, em passagens por países como Espanha, Itália, Holanda, China, Chile, Nova Zelândia, Malásia, Cingapura e Indonésia. Este ano, na preparação para Buenos Aires, passou cinco meses na Indonésia em treinamentos intensivos. "Lá é um nível muito elevado. Eles têm atletas bem diferentes e num patamar superior. Foi importante para mim", disse.

Se o tempo foi de dedicação, acabou também sendo de consternação. Ela estava fora de casa quando o pai, a quem era apegada, morreu de cirrose este ano. "Foi um período muito difícil, mas ele gostava do que faço, me apoiava, tinha orgulho. Quando ganho ou quando perco, sempre lembro dele", disse Jaqueline, que já trouxe para a modalidade a irmã mais nova, Maria Clara, de 12 anos. "Ela está treinando na base e evoluindo". Para o futuro, o projeto de Jaqueline é buscar a seleção adulta e participar de outros campeonatos de grande porte, como os Jogos de Buenos Aires.

Masculino

Fabrício caiu numa chave dura na Argentina. Na estreia, pegou o ucraniano Danylo Bosniuk, número 29 do ranking mundial júnior. Fez um duelo equilibrado. Depois de perder por 21 /15 a primeira parcial, teve três set points na segunda, mas faltou precisão. Tomou a virada e perdeu por 23/21. Na sequência bateu o egípcio Mostafa Kamel por 2 a 0, com 21/14 e 21/10. Na terceira rodada, contudo, teve pela frente o indiano Lakshya Sen, cabeça de chave número quatro e quarto do ranking sub-18. Fabrício tentou, mas não conseguiu segurar o adversário, que venceu por 2 sets a 0, com parciais de 21/6 e 21/16.

"Hoje podemos falar que temos não só um nome, mas vários no radar do Comitê Olímpico, e que podem chegar não só aos Jogos de 2020, mas a 2024, 2028 e até 2032 com o trabalho de hoje"
Norma Rodrigues, técnica da seleção brasileira

"A Índia é um dos polos mais importantes do badminton no mundo. Ele é um dos dez primeiros da lista mundial. Foi bem melhor que eu hoje e me pôs em movimento. Eu sabia da capacidade que ele tinha e da minha, mas ele se saiu melhor", afirmou Fabrício, também integrante do Bolsa Atleta, do Ministério do Esporte. "Para mim, foi uma grande oportunidade representar o país num grande evento. Aproveitei cada momento", resumiu. Fabrício e Jaqueline ainda disputam o torneio por equipe, que misturam atletas de vários países e tem um tom mais de congregação, embora conte para o quadro de medalhas.

Longo prazo

Segundo Norma Rodrigues, o trabalho para levar o badminton do Brasil aos pódios dos eventos internacionais mais importantes é mais para uma maratona do que para uma corrida de 100m rasos. "A Ásia ainda domina a modalidade de forma realmente soberana, mas é bacana você ver como a América vem crescendo, e não só Estados Unidos e Canadá, que já têm estrutura e tradição, mas o Brasil vem colhendo bons resultados".

A treinadora, que é piauiense de Parnaíba com formação em educação física e trabalha em tutorias da modalidade, explica que a grande força de renovação do esporte hoje está conectada a projetos sociais. Citou o do Piauí, mas também elencou o da Miratus, no Rio de Janeiro, de onde saiu o olímpico Ygor Coelho, um núcleo em Niterói (RJ) e outro na Associação Vicente de Paula, no Paraná.

"Os dois aqui vêm de projetos sociais. Eles fizeram uma trajetória de quase dez anos passando por todas as etapas da categoria juvenil. Foram campeões escolares, sul-americanos, pan-americanos e estão nas Olimpíadas", listou Norma. "Mas não é só eles. Tem muitos bons valores. E no Júnior é importante haver quantidade, porque quer dizer que há renovação. Hoje podemos falar que temos não só um nome, mas vários no radar do Comitê Olímpico, e que podem chegar não só aos Jogos de 2020, mas a 2024, 2028 e até 2032 com o trabalho de hoje", encerrou a treinadora.

Gustavo Cunha, de Buenos Aires, na Argentina - rededoesporte.gov.br