Judô
Judô
Mayra Aguiar leva bronze e é a primeira judoca brasileira com dois pódios nos Jogos
Uma garotinha de seis anos vestida com um quimono. Nem competir ela podia, mas perturbou tanto o professor da escolinha que acabou inscrita no torneio. A prata na estreia não seria o suficiente para satisfazer Mayra Aguiar, ainda em versão miniatura. A pequena judoca chorava tanto que os pais tiveram uma certeza: ela iria desistir do esporte ali mesmo. Eles não poderiam estar mais enganados. Mayra enxugou o rosto e perguntou: “Quando é a próxima? Não ganhei essa, mas quero mais”. Ali começava a trajetória da brasileira, que nesta quinta-feira (11.08) precisou, mais uma vez, conter as lágrimas e respirar para ir atrás da medalha de bronze.
» Leia também: Para Mayra, conselho de Guilheiro há quatro anos foi combustível para o bronze no Rio
Repetindo o pódio de Londres, em 2012, Mayra Aguiar é, agora, a única mulher brasileira a conquistar duas medalhas para o judô brasileiro nos Jogos Olímpicos. O sonho do ouro em casa só foi parado na semifinal e diante de uma adversária que ela conhecia bem: a francesa Audrey Tcheumeo. Foi justamente contra ela, em 2014, que a gaúcha sagrou-se campeã mundial. Ao todo, as duas já haviam lutado seis vezes – e a única vitória da europeia tinha sido em 2011, no Grand Slam de Paris.
Vivendo a expectativa de uma nova vitória e da vaga na decisão, Mayra acabou punida com dois shidos – o segundo a apenas 30 segundos do fim da luta – enquanto a adversária recebeu somente um. Sem tempo para superar a desvantagem, a brasileira ajoelhou no tatame e escondeu o rosto. “É um momento bastante difícil. Ali a gente perdeu o que veio buscar”, explica. A tristeza, no entanto, tinha poucos minutos para ceder espaço à vontade de voltar e buscar o bronze contra a cubana Yalennis Castillo.
"Eu não admito perder. Aquilo me dá muita raiva. Eu ia deixar o corpo no tatame, mas não ia sair dali sem a medalha"
Mayra Aguiar
Ali Mayra reviveu a experiência de Londres, quando foi superada na semifinal pela rival americana Kayla Harrison, mas se recompôs para conquistar sua primeira medalha olímpica, há quatro anos. “Eu vi que valeu muito a pena. Aquilo transformou a minha vida. Quando perdi a luta hoje, saí muito abalada, mas coloquei na minha cabeça que eu não podia desistir”, conta. Para a definição do bronze, ela já sabia o que pensar. “Eu coloco na minha cabeça que é uma nova competição. A gente perdeu uma medalha, mas não a guerra”, determina.
Foi assim que, com um yuko e duas punições de vantagem em cima da cubana, vice-campeã olímpica em Pequim-2008, Mayra Aguiar faturou um segundo bronze nos Jogos para seu currículo e a terceira medalha do Brasil no Rio de Janeiro. “Eu não admito perder. Aquilo me dá muita raiva. Eu ia deixar o corpo no tatame, mas não ia sair dali sem a medalha”, afirma. Com a nova conquista, a judoca agora se une a Aurélio Miguel (ouro em Seul-1988 e bronze em Atlanta-1996), Tiago Camilo (prata em Sydney-2000 e bronze em Pequim-2008) e Leandro Guilheiro (bronze em Atenas-2004 e em Pequim-2008) no rol dos brasileiros que subiram duas vezes ao pódio dos Jogos na modalidade.
Dona da casa, Mayra foi empurrada pelo público na Arena Carioca 2 ao longo de todo o dia de competição. “A energia aqui foi mágica, maravilhosa. Conquistar a medalha olímpica em Londres foi lindo, mas agora com a torcida, essa vibração e a emoção que o povo tem, isso aqui foi realmente marcado na minha vida, vou levar para sempre”, emociona-se.
Para se classificar à semifinal contra a francesa, a gaúcha fez duas lutas durante a manhã. Na estreia, já mostrando frieza e disposição, precisou de 39 segundos para conseguir um wazari e a imobilização da australiana Miranda Giambelli. Muito séria e concentrada, Mayra seguiu direto para as quartas de final contra a alemã Luise Malzahn, medalhista de bronze no Mundial do ano passado. As duas já tinham se enfrentado três vezes e Mayra nunca foi derrotada pela adversária. Após uma luta mais acirrada, a brasileira novamente levou a melhor com a diferença mínima de um shido.
» Rafaela Silva leva o judô brasileiro ao topo do pódio no Rio
» "Queria ter escrito uma história diferente hoje", diz Tiago Camilo depois da eliminação
» Mariana Silva coloca o Brasil pela primeira vez em uma disputa de medalha no meio-médio feminino
» Erika Miranda luta pelo bronze mas é derrotada
» Em dia ruim, Sarah Menezes e Felipe Kitadai ficam fora do pódio
» No judô, refugiados vivem dia inesquecível e se emocionam com o carinho dos brasileiros
Retrospecto
Hoje é até difícil imaginar a judoca em outro esporte, mas Mayra Aguiar passou por várias opções antes de se firmar no tatame: fez balé, natação e ginástica, além do atletismo, que seguiu lado a lado com a arte marcial até os 11 anos. Tendo o quimono como exclusividade, ela só precisou de três anos para integrar a seleção brasileira júnior. Aos 15, conquistaria, com um bronze, a primeira medalha em um Mundial Júnior.
Em mundiais sênior, a gaúcha soma quatro pódios: ouro em 2014, prata em 2010 e bronzes em 2011 e 2013. A conquista inédita em Chelyabinsk, há dois anos, teve um sabor que ultrapassou o brilho dourado. Mayra tinha acabado de se recuperar de duas cirurgias simultâneas, no joelho direito e no cotovelo esquerdo, que a obrigaram a passar seis meses parada. Na Rússia, confirmou o bom retorno vencendo Kayla Harrison na semifinal e Audrey Tcheumeo na decisão.
"Era quase impossível repetir um título olímpico, mas meus técnicos me fizeram lutar todos os torneios, me fizeram lutar quando eu estava cansada, exausta, lesionada, doente"
Kayla Harrison
Algoz bicampeã
Fora da final olímpica desta quinta-feira, a brasileira não teve a oportunidade de enfrentar, dentro de casa, a norte-americana, com quem intercalou vitórias e derrotas ao longo dos últimos anos. Desde que a Holanda anunciou uma alteração na lista das convocadas para os Jogos do Rio, as duas adversárias sabiam que só se encontrariam em uma possível decisão – talvez uma das mais aguardadas da competição. Em 17 confrontos, Kayla já venceu nove, contra oito da brasileira.
Com Mayra fora da disputa, a campeã de Londres superou a francesa na decisão para conquistar o bicampeonato. “Era quase impossível repetir um título olímpico, mas meus técnicos me fizeram lutar todos os torneios, me fizeram lutar quando eu estava cansada, exausta, lesionada, doente. Trabalhei muito duro para isso”, comemora. O outro bronze da categoria ficou com Anamari Velensek, da Eslovênia.
Aprendizado
Novato na seleção brasileira e com a responsabilidade de substituir o veterano Luciano Corrêa, Rafael Buzacarini fez sua primeira luta olímpica contra o uruguaio Pablo Aprahamian. O brasileiro, concentrado, não encontrou dificuldades no confronto, aplicando uma chave de braço no rival, que já sofria com a desvantagem de dois shidos. Pela frente, contudo, “Bolo Cru”, como é conhecido entre os amigos, encontraria toda a experiência do japonês campeão mundial Ryunosuke Haga.
“Era a luta decisiva. Eu já sabia que seria difícil, já tinha lutado com ele”, comenta o brasileiro, que perdeu pela segunda vez para o rival após uma punição por falso ataque. “Eu estava bem concentrado, trabalhei duro. Agora é levantar a cabeça”, lamenta, prometendo trabalhar nos erros para ter uma nova chance daqui a quatro anos, em Tóquio.
A disputa do masculino foi vencida por Lukas Krpalek, da República Tcheca, que derrotou Elmar Gasimov na decisão. Os bronzes ficaram com Ryunosuke Haga e com o francês Cyrille Maret. Campeão olímpico em Londres, o russo Tagir Khaibulaev foi eliminado na primeira luta por Gasimov.
O último dia do judô no Rio 2016, nesta sexta-feira (12), terá os peso pesados Rafael Silva (+100kg) e Maria Suelen Altheman (+78kg) lutando para ampliar o número de medalhas brasileiras no quadro da modalidade.
Ana Cláudia Felizola – brasil2016.gov.br