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Judô

10/08/2016 18h03

JUDÔ

No judô, refugiados vivem dia inesquecível e se emocionam com o carinho dos brasileiros

Vivendo no Rio de Janeiro há três anos, Popole Misenga e Yolande Bukasa fizeram suas estreias olímpicas na Arena Carioca 2. O congolês venceu uma luta e agora sonha com revanche contra campeão mundial

Disputar os Jogos Rio 2016 em casa seria um privilégio de apenas 465 brasileiros. Nesta quarta-feira (10.8), esse número cresceu um pouco. Ao entrar na Arena Carioca 2, no Parque Olímpico, representando o Time Olímpico de Refugiados, Popole Misenga e Yolande Bukasa tiveram seus nomes gritados pela torcida. Foram ovacionados ao fim das lutas. Emocionaram-se. Não estavam na República Democrática do Congo, onde nasceram, mas estavam, sim, em casa.

“Nessa luta, eu, refugiada aqui no Rio, me senti bem. Entrei aqui para lutar e ouvi muita gente falando o meu nome, senti como a minha casa”, disse Yolande Mabika. “Quando entrei na arena, achei que não ia ter torcedor, mas o Brasil todo estava torcendo para mim. Fiquei emocionado. Veio um sentimento: tenho que vencer esta primeira luta”, contou Popole.

Popole Misenga agradece o apoio da torcida após a vitória sobre o indiano Avtar Singh: triunfo histórico emocionou a plateia. Foto: Roberto Castro/brasil2016.gov.br
"Quando entrei na arena, achei que não ia ter torcedor, mas o Brasil todo estava torcendo para mim. Fiquei emocionado
Popole Misenga

O judoca de 24 anos conseguiu. O indiano Avtar Singh, 79º do ranking, levou um yuko faltando poucos segundos para o fim da luta. A arena tremeu. Na sequência, Popole – que não disputava uma competição desde 2013 - teria pela frente ninguém menos que o atual campeão mundial, o sul-coreano Donghan Gwak. Mesmo franco favorito, o asiático precisou de 4 minutos para conseguir aplicar um golpe em Popole. E foi definitivo: com um ippon por estrangulamento, Gwak venceu a luta.

“Antes da luta, pensei: ‘Não quero saber se é campeão do mundo, quero ganhar dele’. Lutei até o fim, ele não conseguiu nenhum golpe até o último minuto. Ainda vou atrás dele em outras competições. Vai ter revanche. Acreditem em mim, vou ganhar”, afirmou Popole.

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Yolande perdeu já na estreia para a israelense Linda Bolder, 9ª no ranking: primeiro levou um wazari com 30 segundos e o ippon veio com um minuto de luta. “Eu treinei muito para chegar até aqui. A luta é assim mesmo, a vitória é para uma pessoa. É minha primeira grande competição, a luta não acabou hoje. Terei muitas pela frente, vou treinar mais forte”, disse a judoca, de 28 anos.

Yolande Bukasa enfrenta a israelense Linda Bolder. Foto: Getty Images

As várias lutas

Para quem fugiu da guerra, teve que recomeçar a vida em um outro país, passou dificuldades financeiras e não tem notícias da família, lutar é sinônimo de sobrevivência, é tarefa diária. Mas uma luta em uma arena olímpica lotada, defendendo o primeiro time de refugiados da história, não poderia ser apenas mais uma.

"Este dia de hoje, este 10 de agosto nos Jogos do Rio, eu não poderei esquecer, mesmo que tenha perdido. Lutei no time dos refugiados. Um dia vou contar para meus filhos que fui muito feliz”
Yolande Mabika

“Este dia de hoje na minha vida, este 10 de agosto nos Jogos do Rio, eu não poderei esquecer, mesmo que tenha perdido. Comecei a lutar quando era criança, já são 17 anos no judô. Lutei no time dos refugiados. Um dia vou contar para meus filhos que no dia 10 de agosto eu fui muito feliz”, contou Yolande.

Ali ao lado, dando orientações para os congoleses, um sensei de 73 anos e quatro outras Olimpíadas no currículo segurava a emoção. Geraldo Bernardes viu seu diamante bruto ser lapidado em ouro há dois dias, com a vitória de Rafaela Silva, sua aluna desde que a campeã tinha oito anos. Outro momento especial viria logo depois, ao entrar em uma arena olímpica como técnico, desta vez do Time Olímpico de Refugiados.

Popole Misenga e o sensei Geraldo Bernardes: emoção por ter treinado os dois congoleses na caminhada rumo aos Jogos Olímpicos Rio 2016. Fotos: Roberto Castro/brasil2016.gov.br
"Quando saíram dali, para mim saíram com a medalha do peito. E eu com uma medalha social de ouro”
Geraldo Bernardes

Os pupilos, quase filhos, treinam com ele no Instituto Reação há pouco mais de um ano, mas o trabalho com foco nos Jogos durou só quatro meses, desde que foi confirmado que os dois estariam na equipe de refugiados. Perto dos quatro anos de preparação dos oponentes, Geraldo sabia que seria difícil avançar na competição. Mas a vitória, no caso de Popole e Yolande, não é calculada por yukos, wazaris ou ippons. “Quando saíram dali, para mim saíram com a medalha do peito. E eu com uma medalha social de ouro no meu peito”, disse Geraldo.

“Meu nome já entrou na história olímpica. Um refugiado estava aqui e ganhou uma luta. E lutou também com o campeão do mundo. Para mim é ótimo”, disse Popole. “Eu estou representando muitas nações. Vitória minha é vitória de todos os refugiados no mundo. Eu perdi, o Popole já ganhou uma, estou feliz. Nosso time é de muitas nações, estamos juntos”, acrescentou Yolande.

Confira galeria de imagens do quinto dia do judô no Rio 2016:

Rio 2016 - Judô - 10/08/2016

Carol Delmazo, brasil2016.gov.br