Taekwondo
Taekwondo paralímpico
De olho em Tóquio, Débora Menezes deixa férias de lado para focar no Mundial
Débora Menezes nem se lembra do tempo em que o esporte não fazia parte de sua rotina. Dedicou mais de 12 anos ao futsal no São Paulo no São Caetano. Experimentou o lançamento de dardo no atletismo e bateu o recorde brasileiro. Encarou o vôlei sentado e, há quatro anos, abraçou o taekwondo paralímpico. Por isso, nem tira o sorriso do rosto para contar que as férias de fim de ano não existirão. Aos 28 anos, ela está na fase de lapidação de quesitos técnicos, táticos e físicos. Em fevereiro, na Turquia, disputará o Campeonato Mundial, principal competição do calendário da modalidade em 2019.
"O Mundial vale muitos pontos no ranking para Tóquio. Estou atualmente na oitava colocação. Tenho como meta chegar em sexto no meio do ano"
Débora Menezes
"Nem tenho recesso. Sigo direto nos treinamentos. O Mundial vale muitos pontos no ranking que classifica os atletas para os Jogos Paralímpicos de Tóquio, em 2020. Estou atualmente na oitava colocação. Tenho como meta chegar em sexto ou quinto no meio do ano", afirmou Débora, eleita pelo Comitê Paralímpico Brasileiro a melhor atleta do taekwondo na temporada 2018.
A modalidade estreia no programa paralímpico no megaevento do Japão. Serão 12 classificadas na categoria +58kg, a mais pesada. "Tanto no masculino quanto no feminino são três categorias. Acaba que nessa minha existem discrepâncias. Tem gente com mais de 100kg e dois metros de altura. Eu tenho 75kg e 1,60m. Faz diferença", explicou a paulistana, que busca nos treinamentos formas de driblar essa adversidade.
"Quanto mais leve o atleta, maior a facilidade de se movimentar no tatame. Os mais pesados demoram para levantar a perna, e 90% do taekwondo é chute", disse Débora. Ela busca, em parceria com sua equipe técnica, chegar aos 68kg para ter a mobilidade mais propícia ao tipo de luta que pretende executar. Pela regra paralímpica, a pontuação no taekwondo só ocorre com chutes no tronco.
Além do Mundial, o calendário de 2019 também reserva atenção especial para os Jogos Parapan-Americanos de Lima, no Peru, no segundo semestre, e etapas do circuito mundial. "O Parapan é bem favorável. Vale 40 pontos no ranking. E não existem muitas atletas fortes na minha categoria aqui no continente".
Aceitação de longo prazo
Caçula de uma família com outros três irmãos, Débora nasceu sem o antebraço e a mão direita, resultado de má formação congênita. A diferença física foi um desafio de longo prazo em sua história. "Eu não sabia muito como agir com a minha deficiência. Meus pais também não, mas me colocavam sempre para frente. Repetiam que 'a vida não podia parar'. Isso foi importante, principalmente quando eu não quis mais ir à escola, na primeira série. Porque criança fala mesmo: vê o diferente e aponta".
"O esporte foi transformador. Quebrou tabus e preconceitos na minha vida. Inclusive o meu preconceito, de me aceitar como sou. Até os 18 anos não conseguia me olhar no espelho"
Na época, a mãe dela, Maria Barbosa Menezes, tomou uma decisão. "Ela falou: 'Você vai e vou com você'. Ela passou um ano indo à escola comigo para me proteger. Essa firmeza foi importante para me transformar em quem sou", contou Débora.
Além da presença materna, o esporte foi outro componente estratégico na receita que moldou o caráter de Débora. "Foi transformador. Quebrou tabus e preconceitos. Inclusive o meu preconceito, de me aceitar como sou. Até os 18 anos eu não conseguia me olhar no espelho", contou Débora, que se tornou a primeira filha de Maria Barbosa a concluir uma faculdade, a de educação física.
Mais do que a aceitação, a adaptação foi expressão frequente nessa trajetória. Naturalmente destra, ela teve de se ajustar para usar a mão esquerda para quase tudo. "Sempre fui destra. Assim, precisei aprender na marra a ser "canhota" na mão. Mas, embora tenha trabalhado com as duas pernas no futebol, o direito é o lado natural. No taekwondo a minha base é de destra. Tudo é adaptação de acordo com a nossa realidade".
Débora passou a fazer parte da categoria pódio, a mais alta do programa Bolsa Atleta, do Ministério do Esporte, em 2018. Com isso, ganhou a chance de se dedicar integralmente ao taekwondo. "Antes eu me dividia entre o trabalho com educação física escolar e os treinos. De manhã, trabalhava. À tarde e à noite, treinava. Hoje, estou 100% dedicada ao esporte. Tenho uma equipe multidisciplinar fantástica. Posso dormir melhor e ter a recuperação adequada", comparou. "Veio no momento certo. Tóquio está aí. É uma aposta para chegar bem afiada lá", projetou.
Galeria de fotos: Prêmio Paralímpicos 2018
Gustavo Cunha - rededoesporte.gov.br