Hipismo paralímpico
HIPISMO
Após três horas de espera pelo resultado, Sérgio Oliva comemora o bronze no adestramento
No dia 17 de agosto de 1982, Maria José Ribeiro deu à luz aos trigêmeos Sérgio, Eduardo e Flávio. Após o parto, Sérgio foi parar na incubadora e, por falta de oxigenação, teve paralisia cerebral. A mãe sempre procurou alternativas para melhorar a qualidade de vida do filho. Em 1989, ele começou no hipismo como forma de terapia, mas não gostou e chegou a procurar outros esportes. Sequer podia imaginar que em 2016 conquistaria no Rio de Janeiro uma medalha de bronze nos Jogos Paralímpicos.
O caminho até o pódio, contudo, seria longo. Aos 13 anos, um acidente comprometeu os movimentos de Sérgio Oliva. Ele tropeçou no tapete na porta do prédio em que morava em Brasília e caiu em cima de vidros. O acidente fez com que Sérgio perdesse os movimentos do braço direito. As dificuldades da deficiência, contudo, nunca foram problema para Sérgio, que mora sozinho em um bairro do Plano Piloto, na capital federal. Ele seguiu os mesmos passos que os irmãos, incluindo um intercâmbio no Estados Unidos no último ano do colegial.
“O Sérgio só me dá alegria. Ele foi morar no exterior sozinho, ficou um ano fora e voltou, passou na faculdade de Direito e agora no concurso do Tribunal de Justiça”, conta, orgulhosa, a mãe do atleta sobre o currículo do filho. Nesta quinta-feira (15.09), Maria José saiu do Centro Olímpico de Hipismo, no Complexo Esportivo de Deodoro, com ainda mais motivos de orgulho. Após três horas de espera pelo resultado, Sérgio conquistou a medalha de bronze na prova de adestramento classe IA, a mais severa em relação à capacidade e habilidade equestre.
A prova
O brasiliense foi o sexto cavaleiro a se apresentar no estádio de Deodoro e fechou a prova com a nota de 73.826 com a égua Coco Chanel. Pela frente ainda restavam 20 apresentações. Com a fisionomia tensa, Sérgio não quis comemorar. Em entrevistas, o cavaleiro mostrava para os jornalistas os principais adversários que ainda iriam competir. Entre eles, a britânica Sophie Christiansen, ouro nas últimas duas edições dos Jogos Paralímpicos.
Quase três horas após a apresentação do brasileiro, a britânica de fato fez uma apresentação impecável, somando 78.217 e tirando a liderança de Sérgio. Na sequência, outra britânica, Anne Dunham, de 67 anos, a competidora mais velha da bateria, fez uma ótima apresentação e fechou com a nota de 74.348. A ansiedade só aumentava. Faltava ainda a exibição de uma amazona de Hong Kong, mas na arquibancada o clima já era de euforia por parte da comissão técnica e de familiares. Maria José, Eduardo e Flávio estavam em êxtase.
A festa ficou completa quando Natasha Piu recebeu 63.261 e Sérgio pôde, finalmente, comemorar a medalha de bronze. “Eu trabalhei durante quase 14 anos. São três Paralimpíadas nas costas e foi em casa que eu consegui esse privilégio de estar com esta medalha de bronze no peito. Agora, ninguém me tira esta medalha”, comemora o brasiliense que, em Londres, bateu na trave ao ficar com o quarto lugar na prova.
“Estou muito feliz. Este é um privilégio para poucos, ainda mais em casa, de conquistar esta medalha tão suada depois de quase três horas e meia de agonia. É uma medalha de bronze, mas com gosto de ouro”, completa.
Comemoração com os irmãos
Antes das entrevistas, Sérgio fez questão de dar um abraço nos irmãos Eduardo e Flávio. Emocionados, eles levantaram o medalhista, mostrando para todos a força e a garra do irmão. Ao lado, Maria José alertava: “Amanhã ele compete outra vez, cuidado!”
A comemoração não parou por aí. Sérgio fez questão de tirar fotos com todos, incluindo amigos de infância, e mostrar a medalha. “Em 2007 ele tinha sido campeão mundial e agora ganhou a medalha em casa. Ele já era um orgulho para a família inteira e de repente se tornou um orgulho e uma referência para o Brasil”, elogia Eduardo.
“Acompanhei o Sérgio nas três Paralimpíadas. Em Pequim-2008, Londres-2012, agora no Brasil, e vamos para Tóquio se ele conseguir a vaga”, conta. “O mérito total é da minha mãe, que sempre acompanhou a gente em tudo. Ela é a pessoa central que sempre esteve à frente de todas as batalhas do meu irmão”, completa Eduardo.
Coco Chanel
Após os Jogos de Londres, a equipe de equitação do Brasil teve problemas com os cavalos e precisou ir atrás de uma nova companheira para o brasiliense. “Tivemos um ano sabático atrás de cavalo, procuramos muito, rimos e choramos, mas conseguimos achar um especial para fazer parceria com o Sérgio”, relembra Marcela Parsons, diretora técnica da modalidade.
Sérgio treina com Coco Chanel há apenas oito meses. “O cavalo foi muito especial nesse momento. A égua é fantástica. Nós achamos a Coco Chanel quase abandonada nos fundos de uma casa na Holanda e sem nenhuma experiência em competições paraequestres. Eu apostei e mandei trazer acreditando na medalha. Hoje eu posso chamar a Coco Chanel de Gisele Bündchen porque ela desfilou aqui em Deodoro. Amanhã vai ser um desfile no estilo livre”, avalia Marcela.
Nesta sexta-feira, Sérgio Oliva se apresenta nas finais do freestyle. Além dele, outro cavaleiro brasileiro, Marcos Alves, o Joca, briga por medalha na categoria.
Vera Lúcia Mazzilli
Sérgio Oliva não foi o único brasileiro a emocionar o público em Deodoro. A amazona Vera Lúcia Mazzilli, de 65 anos, atleta mais velha da delegação brasileira, também se apresentou e terminou a prova com a 18a colocação (67.130 pontos). “Podia ser melhor, mas o cavalo perdeu um pouco o ritmo”, destaca.
Com distonia muscular não progressiva desde o primeiro ano de idade, a atleta fez sua estreia em Jogos Paralímpicos e saiu da prova emocionada. “É muita emoção competir aqui, ainda mais na minha idade que é bem avançada contra pessoas tão novas. É muita alegria”, comemora.
Michelle Abílio – brasil2016.gov.br