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Atletismo

11/08/2016 17h27

Entrevista

Ana Sátila: "Foi a pior noite da minha vida"

Atleta brasileira da canoagem slalom revela como foram difíceis os dias posteriores à desclassificação no Jogos Rio 2016, detalhes da prova e planos futuros

São quatro anos de preparação entre um ciclo olímpico e outro, que se resumem em segundos. E foram segundos que marcaram uma vida inteira. De Londres 2012, quando era a atleta mais jovem da delegação brasileira, com 16 anos, para o Rio 2016, quando entrou para competir no Circuito de Canoagem Slalom, em Deodoro, Ana Sátila passou de promessa a esperança de medalha para o país.

Nesse período, foi acumulando bons resultados a cada categoria que passava: Júnior, sub 23, até a principal. No dia 8 de agosto, ela fez a primeira descida no circuito, um local conhecido e de que ela gosta. Nas arquibancadas, o apoio da torcida, que incluía os familiares. Expectativa do tamanho da frustração pelo resultado que não veio.

“Eu fiquei muito triste, foi a pior noite da minha vida”, revela a atleta, em entrevista ao brasil2016.gov.br, nesta quinta-feira (11.08). “Fiquei desapontada, não era o resultado que eu queria. Eu estava treinando muito para essa competição, era muito importante para mim, para o meu país e eu não consegui nem avançar para a semifinal. Foi uma derrota imensa, eu estava muito chateada”, continua Sátila.

Foto: Getty Images

Na fase classificatória da prova do K1 feminino, em que cada canoísta realiza duas descidas no canal, os 15 melhores tempos avançam. A brasileira, que após a primeira descida estava em 12º lugar, terminou o dia em 17º, após sofrer com uma penalidade de 50 segundos na segunda tentativa, por não passar em uma das balizas.

A expectativa se transformou em lágrimas após o resultado final. Ao chegar à Vila dos Atletas, a vontade de Ana Sátila foi de se isolar. “Eu cheguei na Vila e não saí mais do quarto até o dia seguinte, quando recebi várias mensagens de apoio. Começou com o pessoal me visitando, tentando me ajudar, me animar”, revela.

“Fiquei desapontada. Eu estava treinando muito para essa competição, era muito importante para mim, para o meu país e eu não consegui nem avançar para a semifinal. Foi uma derrota imensa"
Ana Sátila

O time brasileiro de canoagem slalom é como uma família. Os atletas passaram todo o ciclo olímpico vivendo na mesma cidade, Foz do Iguaçu (PR), onde foi montado o Centro de Treinamento da modalidade, no canal de Itaipu. Poucos meses antes das Olimpíadas, o grupo se mudou para o Rio de Janeiro e passou a treinar no local de competição. Amizade e união que ajudaram Ana Sátila a erguer a cabeça e compartilhar da alegria dos companheiros que estavam alcançando boas marcas. Pedro Henrique Gonçalves, o Pepê, conquistou um resultado inédito, em sexto no caiaque individual (K1). Na canoa dupla (C2), Anderson Oliveira e Charles Corrêa avançaram até a semifinal.

“No outro dia eu saí do quarto para vir assistir à competição e acabei ficando melhor, com todo o suporte do pessoal. Minha família, meus técnicos, os atletas, eles ficaram ali do meu lado me apoiando e isso ajudou bastante”, disse Sátila, que teve que retomar o ânimo para manter uma tradição da canoagem slalom. Quando um atleta está descendo, os colegas de equipe vão acompanhando a pé, às margens, com gritos de incentivo.

“Os meninos são como meus irmãos, somos uma família, tanto os técnicos quanto os atletas. Torcer ali, gritar pelo amigo, irmão, faz parte. Ninguém desce sem ter torcida, sem ter alguém ao lado, acompanhando. É isso que faz o esporte especial”, completa Sátila, momentos antes de fazer o mesmo caminho para apoiar os "irmãos" Anderson e Charles, que acabaram eliminados na semifinal desta quinta-feira.

Foto: CBCa

A baliza

Hospedada na Vila dos Atletas, Ana Sátila acordou às 7h da manhã no dia da prova, como de costume. Tomou seu lanche, colocou uma música e fez alongamentos. Se arrumou e foi pegar o transporte para Deodoro. Ao chegar ao local de provas, fez a análise do circuito com o técnico e fez o aquecimento na água, cerca de uma hora antes da competição, marcada para as 13h. Após a preparação, nova análise da pista, um lanche e concentração para a primeira descida.

“Eu fiz o que geralmente faço nas competições. Era importante, ali no momento, fazer o que estava acostumada e o que aprendi durante anos. Estava calma, concentrada, relaxada, preparada. Eu queria muito competir. Tinha gana de descer, de participar dos Jogos, queria que começasse. Eu estava me sentindo muito bem”, descreve. Caiaque na água, 24 balizas e o tempo de 110.80 segundos.

“Minha primeira descida eu não fiquei satisfeita, claro, tive alguns erros que eu poderia melhorar bastante”, lembra. Fim da primeira descida das 21 canoístas e Sátila marcava o 12º tempo, que lhe dava a vaga às semifinais.

Hora da segunda descida e a chance de melhorar o tempo para garantir de vez a classificação. Ana Sátila entra no circuito e vai remando forte, com um tempo parcial que estava rendendo os primeiros lugares da classificatória. “Fiz uma segunda descida dando tudo. E foi o que estava acontecendo, estava sempre no limite das portas, indo muito bem, até a parte final, onde eu levei a penalidade”.

Uma corrente de água do circuito afundou parte do caiaque num ponto ruim e ela passou com a cabeça fora da baliza. “Estava concentrada, sabia o que fazer. Só que na canoagem slalom a água sempre muda, não fica do jeito que você analisa. Acabou que a onda segurou meu barco e não consegui chegar onde queria”. Naquele instante, ela não havia se dado conta da infração. Segundos depois, o locutor da arena narrou o fato e a canoísta escutou, quando ainda estava fazendo a descida. “Para mim eu tinha passado (pela baliza), depois fui para a segunda porta, tinha um caminho longo até a baliza seguinte e ouvi o locutor falando que tinha penalidade, mas continuei normal, já estava acabando a pista”.

Ela percorreu o caminho em 99.12 segundos, o que lhe daria a quarta marca, mas com a penalidade de 50 segundos, teve que torcer para que as atletas que viriam depois não baixassem o tempo que ela havia feito na primeira descida. “As outras meninas começaram a baixar o tempo e fiquei fora”, descreve a atleta, que terminou em 17º, uma posição abaixo de Londres 2012.

Especialista no C1, ela abriu mão de competir nesta categoria este ano para se dedicar ao K1, única prova olímpica entre as mulheres. No entanto, a Federação Internacional da modalidade sinaliza com a inclusão da canoa individual nos Jogos de Tóquio 2020. Uma boa notícia para a brasileira. “Com certeza Tóquio vai ser uma surpresa, eu vou me dedicar ainda mais. É tudo o que quero agora, continuar remando forte e treinando bem”, projeta.

Águas passadas

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Foto: Gabriel Fialho/brasil2016.gov.br

Aos 20 anos e com a experiência de duas Olimpíadas, Ana Sátila integra uma geração promissora de desportistas jovens em modalidades que não têm tradição no país, como Hugo Calderano, no tênis de mesa, e Marcus Vinícius, no tiro com arco. A canoísta mineira, que aos nove anos se mudou para Foz do Iguaçu e passou a se dedicar ao esporte, mostra que tem consciência do seu talento. Afinal, ela coleciona medalhas em Pan-Americanos, Sul-Americanos, Mundiais de base e na Copa do Mundo sênior.

“Eu tinha capacidade para estar na próxima fase, de estar na final, mas esse é o meu esporte, a gente nunca sabe o que vai acontecer. No dia anterior, o melhor do mundo ficou fora da semifinal do K1 masculino. Sempre acontece. Desta vez foi comigo. Fiquei triste, mas agora só quero pensar em erguer a cabeça e continuar treinando forte”, afirmou. 

Agora, Ana Sátila terá mais alguns dias para curtir a Vila dos Atletas e descansar, antes de embarcar para mais uma etapa da Copa do Mundo, em Praga, na República Tcheca. “Eu quero estar preparada, chegar no meu melhor para competir e representar o país”. Sinal que a água já passou por debaixo da ponte. O sorriso confirma.

Gabriel Fialho - brasil2016.gov.br