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Vela

17/08/2016 04h12

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“Vovô” da Nacra 17 supera câncer, leva ouro histórico e vive sonho olímpico em família

O argentino Santiago Lange conquistou, aos 54 anos e ao lado de Cecília Saroli, o título da Nacra17. Os filhos dele, Yago e Klaus, disputam hoje a Medal Race da 49er

Medalhista de bronze em Atenas 2004 e Pequim 2008, na extinta classe Tornado, o veterano velejador Santiago Lange viu o sonho de disputar a sexta olimpíada ameaçado às vésperas do Rio 2016. Diagnosticado com um câncer em um dos pulmões em 2015, o argentino teve que parar os treinamentos e, após ter o órgão removido, se recuperou de maneira impressionante. Retornou a tempo de conquistar o ouro, o primeiro da história da Nacra 17, categoria estreante em Jogos Olímpicos, considerada uma das mais “jovens” da vela.

“No dia seguinte à cerimônia de abertura, chorei a manhã inteira depois de ver Robert Scheidt falando com os atletas e de ter visto a chama olímpica no estádio junto a meus filhos. Têm sido jogos muito emocionantes, eu assistindo às provas dos meus filhos e eles às minhas. E hoje, celebrar com eles foi demais para mim"
Santiago Lange

Além de sair vitorioso do maior evento esportivo do mundo aos 54 anos, Santi, como é conhecido, pôde ainda viver junto aos filhos Yago e Klaus o sonho de disputar as Olimpíadas. Representantes argentinos na 49er, os herdeiros da família Lange disputam a Medal Race da categoria nesta quinta-feira (18.08).

“No dia seguinte à cerimônia de abertura, chorei a manhã inteira depois de ver Robert Scheidt falando com os atletas e de ter visto a chama olímpica no estádio junto a meus filhos. Têm sido jogos muito emocionantes, eu assistindo às provas dos meus filhos e eles às minhas. E hoje, celebrar com eles foi demais para mim. Espero que meu coração sobreviva”, emocionou-se Lange. Para o atleta, a presença de seus descendentes nos Jogos foi determinante para a sequência de acontecimentos que culminaram em sua vitória.

“Tenho certeza absoluta de que estou aqui por causa dos meus filhos. Pensei que depois de Pequim eu não iria mais às Olimpíadas. Comecei este ciclo olímpico como técnico dos meus filhos, mas no verão, enquanto corria na praia aqui no Brasil, pensei que não estaria à altura deles. Enquanto isso, Cecília parou de velejar com seu antigo parceiro e veio me pedir conselhos, se deveria voltar à Laser ou continuar na Nacra. Eu disse: ‘Você pode tentar com este velho aqui’. E, por sorte, ela aceitou”, contou. Apesar de lamentar ter perdido alguns momentos em família por causa dos treinamentos, Santi está convencido de que tudo valeu a pena. “Yago, Klaus e eu nos demos conta do quanto somos privilegiados de estar dividindo esse momento e demonstramos isso cada vez mais”, apontou. 

Santiago Lange comemora o título na Nacra 17: uma das histórias mais inspiradoras dos Jogos Rio 2016. Foto: Getty Images

Parceira de Santiago na campanha dourada, Cecília Carranza Saroli destacou a mentalidade vencedora do companheiro. “Não sei se é porque Santi não gosta de falar da doença que teve ou de sua idade, mas é simplesmente uma pessoa que segue em frente e sai por cima de todas as situações porque pensa sempre em como evoluir e como trabalhar melhor. É apaixonado pelo que faz e isso faz com que trabalhe muitíssimo todos os dias para melhorar em sua atividade. Para mim, é um prazer trabalhar a seu lado, porque isso contagia, e muito, não apenas a mim, mas a toda a equipe”, afirmou.  

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Santiago admite que, há algum tempo, não queria falar da enfermidade que teve. No entanto, um conselho de seu professor de yoga fez com que mudasse essa visão. “Não gostava de falar sobre a doença que tive no ano passado, porque acho que como atleta olímpico eu deveria falar sobre esportes. Quando alguns meios de comunicação argentinos começaram a colocar nos títulos que eu havia passado por um câncer e tudo mais, fiquei um pouco chateado. Mas, em uma daquelas manhãs eu falei com Zani e ele me disse para tomar cuidado, porque talvez minha história estivesse ajudando muita gente. Agora vejo desta forma. Se minha história estiver ajudando pessoas que estão em situações semelhantes ou piores, me sinto orgulhoso disso e espero que essas pessoas possam superar da melhor forma que puderem”, disse. De acordo com o próprio Lange, um mês após a cirurgia de retirada do pulmão esquerdo, em setembro passado, ele estava velejando. 

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Santiago e Cecília assim que ficou confirmado o ouro olímpico para a Argentina. Foto: Getty Images

Integrante da dupla que ficou com o bronze na Nacra 17, o austríaco Thomas Zajac, de 30 anos, classificou como “uma honra” poder competir ao lado de alguém com a biografia do sul-americano. “Comecei  a velejar na Tornado há 14 anos e, nesta época, Santiago treinava com as equipes austríacas. Fomos sortudos e felizes de nos juntar a ele. Há 14 anos ele já era uma espécie de herói e eu fiquei impressionado quando vi ele voltar na Nacra 17. Muitos diziam: ‘Ah, este velho’, mas ele mostrou a todos que está aqui”, disse.  

Durante a conversa com os jornalistas, quando perguntado se sua conquista poderia servir de exemplo para levar Robert Scheidt a competir em mais uma olimpíada, o argentino se desdobrou em elogios ao brasileiro. “Em primeiro lugar, admiro demais o Robert. Tive o privilégio de competir com ele na Laser em 1996. É um verdadeiro esportista. Foi um prazer, ele é inacreditável. Não é somente um velejador talentoso capaz de vencer regatas, é uma pessoa honesta e comprometida, um verdadeiro atleta. Seria demais para mim inspirá-lo, não é o caso, mas acho que Scheidt sempre pode voltar. Ele sempre teria chance de medalha, com certeza”, finalizou.

Pedro Ramos - brasil2016.gov.br