Você está aqui: Página Inicial / Notícias / Martine Grael e Kahena Kunze brilham com um ouro emocionante na Baía da Guanabara

Vela

18/08/2016 20h35

VELA

Martine Grael e Kahena Kunze brilham com um ouro emocionante na Baía da Guanabara

Após uma reação eletrizante e uma chegada de tirar o fôlego, as velejadoras da classe 49er FX conquistam a primeira medalha dourada da história da vela feminina brasileira

Juntas, elas compartilham diversos valores: a tradição familiar na vela, a paixão pelo esporte, o empenho para trabalhar duro visando à evolução e, principalmente, a capacidade de levar o  país ao lugar mais alto do pódio. E foi somando todos esses ingredientes que as velejadoras Martine Grael e Kahena Kunze escreveram, nesta quinta-feira (18.8), mais um episódio dourado e histórico para o Brasil.

Martine Grael e Kahena Kunze no pódio olímpico: história iniciada em 2012 terminou de modo dourado no Rio. Foto: Danilo Borges/brasil2016.gov.br

Sob um céu nublado e competindo em condições de vento forte e variante na Baía de Guanabara, a fluminense de Niterói Martine Grael e a paulista Kahena Kunze, ambas de 25 anos, conquistaram uma medalha de ouro inédita para o esporte do país. As duas venceram, de forma emocionante, a final da classe 49er FX – última regata disputada nos Jogos Olímpicos do Brasil – e se tornaram as primeiras campeãs olímpicas da vela brasileira.

“Na hora da chegada foi emocionante, nem conseguia nadar, de tanto que o meu coração batia. É indescritível subir e receber essa medalha, com os amigos e familiares gritando por você”
Kahena Kunze

“Na hora da chegada foi emocionante, nem conseguia nadar, de tanto que o meu coração batia. É indescritível subir e receber essa medalha, com os amigos e familiares gritando por você, os voluntários que fizeram esse evento maravilhoso... Não tem preço. Minha primeira Olimpíada e começar assim? Imagina a segunda!”, vibrou Kahena.

Emoção até o fim

A sétima medalha de ouro do Brasil na história da vela foi escrita com um roteiro dramático. Muito antes da largada, Martine, Kahena e todos os envolvidos com a modalidade no país já sabiam que a parada seria duríssima. O que ninguém imaginava é que o desfecho seria tão emocionante.

Depois de 12 regatas disputadas, quatro países avançaram à Medal Race, como é chamada a prova que define o pódio na vela, em condições de conquistar o ouro no Rio. As espanholas Tamra Echegoyen Dominguez e Berta Betanzos Moro e as dinamarquesas Jena Hansen e Katja Steen Salskov-Iversen estavam empatadas com Martine e Kahena na liderança, todas com 46 pontos perdidos. Logo atrás, bem perto  das líderes, vinha a dupla da Nova Zelândia formada por Alex Maloney e Molly Meech, com 47 pontos.

Na Medal Race, a pontuação é dobrada. O vencedor perde dois pontos, o segundo colocado perde quatro, e assim por diante. Ao final, o barco que tiver o menor número de pontos perdidos conquista o título.

Nesse cenário de quatro barcos tão próximos na briga pelo ouro olímpico no Rio, chegar em primeiro não era o fundamental. Para conquistar o topo do pódio era preciso, apenas, ser mais rápido do que os outros concorrentes.

Mas o ouro de Martina e Kahena foi forjado com um triunfo espetacular. As duas, que chegaram a cair para a oitava posição durante a prova, se recuperaram e velejaram por um bom tempo atrás das neozelandesas e das italianas Giulia Conti e Francesca Clapcich.

No mar, a briga do barco brasileiro com as rivais da Nova Zelândia foi intensa até o final: apenas 2 segundos de diferença entre o ouro e a prata. Foto: Danilo Borges/brasil2016.gov.br

Ao contornarem a penúltima boia, as italianas ainda estavam à frente e as brasileiras, nesse momento com a prata, passaram pela marca seis segundos atrás do barco da Nova Zelândia. Foi então que, nos instantes finais, Martine e Kahena deram início a uma recuperação que fez as centenas de pessoas que acompanharam a prova na praia prenderem a respiração.

As duas ultrapassaram os dois barcos que estavam na ponta, assumiram a liderança e cruzaram a linha de chegada com uma diferença de apenas dois segundos para Alex Maloney e Molly Meech, que levaram a prata. O bronze ficou com as dinamarquesas Jena Hansen e Katja Steen Salskov-Iversen.

“Só tenho a agradecer todas as pessoas que vieram torcer por nós. Estou muito feliz com a quantidade de amigos, a galera torcendo, parecia o Maracanã, fazendo ola, muito muito legal”
Martine Grael

“A gente estava assistindo todas as regatas que tiveram aqui antes e, com algumas informações dos outros dias, a gente viu que estava bem aberto, estava dando os dois lados, o vento estava mais forte, mais fraco... a gente observou bem antes”, contou Martine. “Na quarta perna, a gente montou a boia indo para a esquerda e a galera toda indo para a direta. Foi bom que a dinamarquesa veio com a gente e deu uma segurança, a gente já estava marcando elas, então era uma adversária a menos. No último contravento, a gente foi com tudo para a esquerda, porque a bandeira lá no Forte estava tremulando e a gente viu que ia ser bom”, continuou a velejadora.

“Acho que essa foi a nossa chegada mais apertada. Eu só queria que tivesse mais uma medalha para as espanholas”, lamentou Kahena, referindo-se aos dois segundos de diferença para as vice-campeãs e ao esforço que as rivais da Espanha fizeram ao longo de toda a Olimpíada no Rio.

“Acho que esse foi o campeonato mais legal da minha vida, não só agora, que a gente ganhou a medalha, mas antes. Hoje (antes da prova) eu vinha já pensando nisso: que tinha sido o campeonato mais legal que eu corri. Nunca foi tão disputado assim entre as primeiras velejadoras”, emendou Martine.

Assim que as duas cruzaram a linha de chegada, uma explosão de alegria tomou conta das areias da Praia do Flamengo. O Brasil acabara de ver nascer duas novas heroínas do esporte nacional e a família Grael adicionara mais uma medalha à sua incrível coleção de pódios olímpicos.

Antes mesmo de chegar à praia, Martine e Kahena foram parabenizadas na água, por familiares e amigos, que nadaram até as duas para abraçar as campeãs olímpicas. “Só tenho a agradecer todas as pessoas que vieram torcer por nós. Estou muito feliz com a quantidade de amigos, a galera torcendo, parecia o Maracanã, fazendo ola, muito legal”, continuou Martine.

Festa na água, com a torcida e no pódio: festival de emoção para Martine e Kahena no Rio. Fotos: Danilo Borges/brasil2016.gov.br

Vela no sangue  

Não é exagero afirmar que tanto Martine quanto Kahena têm a vela no DNA. O pai e o tio da primeira dispensam apresentações. Torben Grael é dono de cinco medalhas olímpicas (duas de ouro, uma de prata e duas de bronze) e é um dos 12 bicampeões olímpicos do Brasil. O tio de Martine é Lars Grael, que tem outras duas medalhas de bronze nos Jogos. Para completar, o pai de Kahena, Cláudio Kunze, foi campeão mundial da classe Pinguim em 1973.

Em terra, Torben Grael e a mãe de Martine, Andrea Grael, acompanharam o sucesso da filha vivendo fortíssimas emoções. Apesar das cinco medalhas do marido, essa foi a primeira vez que Andrea assistiu de tão perto alguém da família conquistar uma medalha nos Jogos, já que não acompanhou Torben em nenhuma ocasião durante as Olimpíadas que o marido disputou.

Para ela, o sucesso da família tem algumas explicações. “Não é segredo. Isso aí é treinamento para caramba. É muita ralação. É óbvio que é muito legal a gente ter isso na família, mas acima de tudo temos o gosto por velejar. O que vem da família mesmo é que todo mundo lá tem sangue de água salgada”, afirmou Andrea, que foi quem levou Martine para velejar pela primeira vez na Baía de Guanabara, quando a hoje campeã olímpica tinha apenas 4 anos.

Rio 2016 - Vela - 49er FX feminina - 18/08/2016

“Eu estava muito nervosa, acordei várias vezes ao longo da noite. Eu pensava que elas seriam medalhistas, mas o ouro é o ouro. Hoje cedo, elas estavam muito tranquilas. Eu abracei as duas e senti que ia dar certo. Eu disse: ‘Façam o que vocês sabem de melhor, que é velejar. E curtam a velejada’. Foi o que elas fizeram”, contou Audrey, mãe de Kahena.

Feliz da vida com o sucesso de Martine e Kahena, Torben era só sorriso na praia enquanto aguardava o momento de vê-las repetir algo que ele mesmo experimentou duas vezes: subir ao lugar mais alto do pódio para receber um ouro olímpico.

“São agora oito medalhas na família. É mais do que alguns países”, observou o bicampeão, que revelou que os três times medalhistas na 49er FX treinaram juntos antes do Rio 2016. “Eu acho que isso nos orgulha muito. A gente vem de um clubezinho pequeno em Niterói, o Rio Yacht Club, e justamente na classe delas as três medalhistas estavam treinando juntas, baseadas no clube. Estavam as neozelandesas, as dinamarquesas e elas. Então acho que isso foi decisivo”, opinou.

Por último, Torben reconheceu que ficar na praia vendo a filha disputando uma final olímpica é bem mais complicado do que estar no barco defendendo o Brasil. “É muito mais difícil estar aqui do que estar lá disputando. Não tinha como ser mais difícil e emocionante. Ainda bem que acabou com final feliz”, disse.

Ao final de tudo, com o objetivo maior alcançado, Martine fez questão de agradecer a parceira que, desde 2012, quando a dupla foi montada, a acompanhou no sonho de um ouro olímpico. “Muita amizade, muita compreensão entre nós. A gente teve uma mudança muito grande no nosso relacionamento. Teve uma ‘profissionalização’. Além de amigas do peito, a gente passou a ser parceiras também. Foi uma parceria muito bonita. Eu não poderia ter tido esse resultado e passado esses quatro anos com mais ninguém. Ela foi ótima”, encerrou a campeã.

Luiz Roberto Magalhães – brasil2016.gov.br