Halterofilismo paralímpico
Halterofilismo
Mariana D’Andrea levanta um ‘ouro de 137kg’ nos Jogos Paralímpicos de Tóquio
O Fórum Internacional de Tóquio registrou neste domingo (29.08) um momento histórico para o halterofilismo brasileiro. Com apenas 69kg quando sobe numa balança, a brasileira Mariana D’Andrea, de 23 anos, foi capaz de erguer uma barra com quase o dobro do seu peso para conquistar o título dos Jogos Paralímpicos na categoria para atletas com menos de 73kg.
Mariana ergueu 137kg na terceira de suas tentativas, o maior peso que já conseguiu validar numa competição oficial. Um feito que vem pontilhado de significados simbólicos. A marca é o novo recorde das Américas. Faz de Mariana a primeira mulher brasileira a subir ao pódio na modalidade. E dá ao Brasil o primeiro título do halterofilismo na história dos Jogos Paralímpicos.
Venho treinando esses cinco anos atrás desse objetivo. Eu sabia que ele ia se realizar aqui porque tudo o que passei não foi fácil e eu não desisti nenhum minuto”
Mariana D'Andrea
“Estou muito feliz, muito grata por tudo. Venho treinando esses cinco anos atrás desse objetivo. Eu sabia que ele ia se realizar aqui porque tudo o que passei não foi fácil e eu não desisti nenhum minuto”, afirmou a atleta. “Foi a primeira vez mesmo que levantei esse peso em competição. Veio na hora certa. A melhor marca anterior era 135kg. Eu ia até tentar quebrar o recorde paralímpico aqui, mas não houve oportunidade para isso hoje”, comentou.
O recorde paralímpico é de 140kg e pertence à francesa Souhad Ghazouani, que foi medalhista de bronze em Tóquio, ao levantar 134 quilos em sua melhor tentativa. A prata ficou com a chinesa Lili Xu, que travou batalha direta com Mariana na disputa pelo título.
Na primeira das três rodadas, Mariana levantou a barra com 130kg e estabeleceu a liderança. Na segunda, a chinesa ergueu 134kg e ficou à frente de Mariana, que tinha registrado 133kg. A disputa entre as duas foi para a última rodada. Mariana colocou a barra em 137kg e foi bem sucedida, ainda que após alguns segundos de suspense para a decisão dos árbitros sobre a validade do movimento. A última a entrar no tablado foi a chinesa. Ela ajustou a barra para 138kg, mas o movimento não foi validado pelos árbitros e o título foi confirmado.
“Naquele momento eu já estava muito feliz por saber que estava com a prata garantida. Quando vi que ela infelizmente não conseguiu concluir o movimento, fiquei muito feliz. Foi aquele momento em que tudo o que você passa parece valer a pena. Consegui realizar meu sonho, a minha medalha de ouro, a primeira do halterofilismo feminino do Brasil”, celebrou.
Ciclo consistente
“Eu tive o privilégio de continuar treinando na pandemia. Por isso estava bem preparada nas copas do mundo disputadas online e consegui a liderança do ranking após o ouro na Geórgia"
Talento da nova geração, a paulista de Itu tem nanismo. Seu atual técnico, Valdecir Lopes, esbarrou com ela na rua, em 2015, e a convidou para praticar o halterofilismo. Ainda no início da carreira, disputou os Jogos Rio 2016, mas foi coadjuvante. “Eu era muito nova no esporte naquela época, estava começando. Mas ali eu tive a certeza de que queria muito treinar para estar neste pódio”, contou.
No ciclo de cinco anos entre os dois eventos, Mariana cresceu de forma exponencial. Chegou a Tóquio amparada por um retrospecto que justificava o sonho do pódio. Ela se tornou líder do ranking mundial após conquistar o título da etapa de Tbilisi, na Geórgia, da Copa do Mundo, em 2021. Antes, tinha sido ouro nos Jogos Parapan-Americanos de Lima, em 2019, além de prata por equipe e quarta no individual no Mundial do Cazaquistão, em 2019.
Durante o período da pandemia da Covid-19, ela conseguiu se manter em atividade nos treinos e se manteve competitiva com torneios online. “Eu tive o privilégio de continuar treinando nesse período, de fazer meus treinos mesmo durante a pandemia. Por isso estava bem preparada nas copas do mundo disputadas online e consegui a liderança do ranking após o ouro na Geórgia".
Lamento de Evânio
“Infelizmente as três tentativas de levantar 200kg foram inválidas. Eu vinha de lesão, com muito tempo tratando e sem poder treinar da melhor forma. Agora é bola para frente e treinar mais ainda para chegar melhor em Paris”
Evânio Rodrigues
O outro brasileiro em ação neste domingo não teve a trajetória de que gostaria. Na categoria -88kg masculina, Evânio Rodrigues tentava repetir o pódio que conquistou nos Jogos Rio 2016, quando saiu com a medalha de prata. Desta vez, contudo, a reta final de preparação do baiano de Cícero Dantas não ocorreu da forma devida. Evânio precisou conciliar treinos com o tratamento de uma lesão no peitoral para se manter minimamente competitivo em Tóquio.
Na chegada à capital japonesa, acabou ainda incluído no “grupo cinza”, de atletas nacionais que tiveram contato próximo com um integrante da delegação nacional que testou positivo para Covid-19. Por isso, mesmo com todos os testes negativos, perdeu cinco dias de treinamento que, na visão dele, seriam preciosos para a retomada do ritmo.
“Eu dei o meu melhor, mas infelizmente as três pedidas para levantar 200kg foram inválidas. Eu vinha de lesão, com muito tempo tratando e sem poder treinar da melhor forma. Cheguei aqui machucado e ainda ficamos cinco dias sem treinar em função da proximidade com uma pessoa que estava infectada. Ficamos trancados. Voltamos aos treinos, mas as dores não passavam e foi isso aí. Agora é bola para frente e treinar mais ainda para chegar melhor em Paris”, lamentou o atleta.
Evânio teve poliomielite aos seis meses de idade, o que causou um encurtamento da perna direita. Começou a praticar halterofilismo em 2010 a convite de um amigo. No ciclo Rio – Tóquio, foi prata na etapa de Tbilisi da Copa do Mundo 2021, ouro na Copa do Mundo da Nigéria em 2020 e campeão dos Jogos Parapan-Americnos de Lima, em 2019. O atleta de 36 anos ainda foi prata por equipe no Mundial da modalidade no Cazaquistão, em 2019, e medalhista de bronze no Mundial da Cidade do México, em 2017.
Nos Jogos de Tóquio, o ouro na categoria dele ficou com Abdelkareem Mohmmad Khattab, da Jordânia, que levantou 231 quilos e estabeleceu um novo recorde paralímpico na categoria. O atleta também é dono do recorde mundial da categoria, com 240 erguidos em junho, em Dubai, nos Emirados Árabes. A prata ficou com o chinês Jixiong Ye, com 220 quilos na melhor das três tentativas, e o bronze com Hany Abdelhady, do Egito, com 214kg.
Modo de disputa
No halterofilismo competem homens e mulheres com deficiência nos membros inferiores (com amputação de membros inferiores e/ou com lesão medular) e/ou com paralisia cerebral. Os atletas competem em Classe Única, divididos por categorias de peso corporal, assim como na versão olímpica. São dez categorias masculinas e dez femininas.
Os atletas competem deitados e precisam subir sobre seus peitos a barra com o peso escolhido por eles. Três árbitros avaliam quesitos como equilíbrio, segurança e o controle do atleta no manejo da barra. Se dois dos três árbitros julgarem que o peso foi erguido de forma correta, o movimento é considerado válido.
Investimento
O Brasil é representado por sete atletas no halterofilismo em Tóquio. Todos eles são integrantes da categoria Pódio, a principal do Bolsa Atleta, programa de patrocínio individual do Governo Federal Brasileiro. A Bolsa Pódio prevê repasses mensais de R$ 5 mil a R$ 15 mil para atletas que se qualificam entre os 20 melhores do mundo em sua modalidade.
No ciclo Rio - Tóquio (2017 a 2021), o grupo dos sete atletas em Tóquio recebeu R$ 2,3 milhões em repasses diretos, via Bolsa Atleta. No mesmo período, o Governo Federal repassou R$ 5,6 milhões via Bolsa Atleta para honrar o pagamento de 202 bolsas a 89 atletas da modalidade como um todo.
Gustavo Cunha, de Tóquio, no Japão – rededoesporte.gov.br