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Halterofilismo paralímpico

13/09/2016 15h51

Halterofilismo

Evânio Rodrigues faz história no halterofilismo: prata inédita

O baiano, que quase desistiu do esporte após ter ficado de fora dos Jogos de Londres 2012, emociona familiares e vai às lágrimas no pódio ao se tornar o primeiro halterofilista do Brasil a chegar a uma medalha nos Jogos Paralímpicos

Um quilo. Um peso insignificante para qualquer atleta de halterofilismo, mas que há quatro anos seguia na mente do baiano Evânio Rodrigues da Silva como uma lembrança de um sonho que poderia ter sido realizado na Inglaterra, com a participação nos Jogos Paralímpicos de Londres 2012, mas que acabou não se concretizando.

Evânio, em um pódio histórico para o halterofilismo brasileiro. Foto: Cezar Loureiro/MPIX/CPB

Mas o esporte tem o poder de redenção que em muitos casos é capaz de apagar as tristezas e transformá-las em emoções. E na manhã desta terça-feira (13.9), no Pavilhão 2 do Riocentro, Evânio Rodrigues descobriu isso.

Se há quatro anos ele sofreu uma enorme decepção ao não se classificar para as Paralimpíadas de Londres por apenas um quilo, a recompensa, após um ciclo de trabalho, veio de uma forma que ele jamais vai se esquecer.

Até esta manhã, o halterofilismo brasileiro nunca havia subido ao pódio em Paralimpíadas. Evânio acordou para mudar essa história. Competindo na categoria -88kg, o halterofilista, nascido na pequena cidade de Cícero Dantas, um município de cerca de 34 mil habitantes, encheu sua família e sua terra natal de orgulho ao se tornar o primeiro medalhista do país na modalidade nos Jogos Paralímpicos.

Depois de erguer 205kg na primeira apresentação e 210kg na segunda tentativa (ele ainda tentou superar os 215kg na terceira chance, mas sem sucesso), Evânio conquistou a medalha de prata para o Brasil e fez história, para a alegria do pai, da mãe, dos irmãos e dos primos que não se continham de felicidade nas arquibancadas.

“Eu tinha ficado de fora nas Paralimpíadas de Londres, pensei até em desistir, mas a minha vontade falou mais alto. Eu amo esse esporte. Eu vivo para isso. Tive várias barreiras que estavam impedindo, mas eu sempre pensei positivo, fui pra frente e estou hoje aqui, realizado”
Evânio Rodrigues 

A medalha de ouro ficou com Mohammed Khalaf, dos Emirados Árabes Unidos (220kg), e o bronze foi para Sodnompiljee Enkhbayar, da Mongólia, que também ergueu 210kg, mas que pelo fato de ter um maior peso corporal do que o brasileiro (critério de desempate) acabou perdendo a prata.

 

O Brasil ainda tentou conquistar mais uma medalha nesta terça-feira no Pavilhão 2 do Riocentro com Márcia Menezes, na categoria -86kg, mas a atleta não obteve sucesso. Após erguer 111kg na primeira tentativa, ela falhou nas duas seguintes para superar 117kg e acabou ficando fora do pódio, em quinto. O ouro foi para a egípcia Randa Mahmoud (130kg), a prata para a jordaniana Tharwah Alhajaj (119kg) e o bronze para a mexicana Catalina Diaz Vilchis (117kg).

“Foi muito trabalho e treinamento também para focar mais na competição e não deixar a adrenalina atrapalhar, porque se ela atrapalhar você não consegue fazer o movimento válido”, contou Evânio. “Eu me concentrei muito, fiquei muito na minha, lá no meu canto, para na hora não pensar em nada, só pensar em completar o movimento. E eu consegui. Foi um sonho realizado hoje. Essa minha primeira medalha é inédita em nosso esporte”, comemorou o baiano, que se emocionou muito ao ver os familiares nas arquibancadas, que pela primeira vez puderam vê-lo em ação e trouxeram sorte.

“Quando eu vi minha família...”, interrompeu o halterofilista para cair nas lágrimas em seguida. “Ela é tudo para mim. Eu estou longe dela faz nove anos e não é fácil. É muito tempo sem vê-los. Mas hoje tive a recompensa. E fico feliz porque é a primeira vez que eles estão vendo o meu esporte. E quando eu os vi agora foi muita emoção. Minha família é tudo. Meus maiores fãs são da minha família”, disse, ainda aos prantos. Depois, ele agradeceu a todos os que o ajudaram na caminhada até a medalha.

“Eu só tenho a agradecer a todo mundo que torceu por mim e a eles (os familiares), que vieram de longe para torcer por mim. Vieram da Bahia e outros vieram do litoral de São Paulo só para torcer, para estar ao meu lado, e eu fiquei feliz e realizado. Eu tinha ficado de fora nas Paralimpíadas de Londres, pensei até em desistir, mas a minha vontade falou mais alto. Eu amo esse esporte. Eu vivo para isso. Eu faço o que gosto. Tive várias barreiras que estavam impedindo, mas sempre pensei positivo, fui para frente e estou hoje aqui, realizado”, celebrou Evânio, que recordou o que passou até subir ao pódio dos Jogos Paralímpicos Rio 2016.

Emoção incontrolável: vice-campeão dos Jogos Paralímpicos vai às lágrimas no Pavilhão 2 do Riocentro. Fotos: Cezar Loureiro/MPIX/CPB

“Eu dei o meu melhor. A melhor marca de toda a minha vida foi essa de hoje e não é fácil fazer um movimento válido aqui. É difícil, porque a pressão é grande. Aqui é uma competição vista por milhares de pessoas e não é fácil você estar entre os melhores do mundo. Foi muito trabalho. Pelo ranking só iam (para as Paralimpíadas) os oito melhores do mundo e consegui ficar em oitavo. Eu vi que estava em oitavo mas que podia conseguir melhorar. Só que não foi fácil. Nesses últimos quatro meses eu tive que ganhar dez quilos de peso corporal.  E eu não como muito. Tive que tomar suplemento, acordar para comer toda hora...”, lembrou.

Evânio ainda fez um agradecimento especial a seu técnico, Valdecir Lopes, e a um atleta do Egito, em particular, Sherif Osman – ouro no Rio 2016 na categoria -59kg e tricampeão dos Jogos Paralímpicos (venceu também em Pequim 2008 e Londres 2012), que veio treinar no Brasil em abril e acabou se tornando um amigo e parceiro dos brasileiros.

“Eu dei o meu melhor. A melhor marca de toda a minha vida foi essa de hoje e não é fácil fazer um movimento válido aqui. É muito difícil, porque a pressão é muito grande. Pelo ranking só iam (para as Paralimpíadas) os oito melhores do mundo e eu consegui ficar em oitavo. Eu vi que estava em oitavo mas que podia conseguir melhorar”

“A gente teve uma ajuda de fora, um treino diferente. Juntou com o nosso treino e deu certo. O Sherif veio passar um tempo no Brasil e a gente aprendeu muita coisa com ele. Hoje ele estava torcendo por mim como se a gente fosse do mesmo país. Tenho que agradecer a ele e a meu técnico. Quando juntou os dois deu isso aí: um sonho realizado”, destacou o medalhista, que desde o final da competição passou a viver uma fábula.

“A ficha não caiu ainda. Esse sonho estou realizando não só por mim. É por várias pessoas que tentaram e ficaram no caminho. Mas eu estou conseguindo por todos eles. É por todo mundo, não é só por mim”, ressaltou Evânio.

Primeiro pódio aos 23 anos

Com a medalha no peito e segurando o simpático Tom personalizado com os cabelos prateados, Evânio, que sofreu com a poliomielite ainda bebê, recordou toda sua história, desde os problemas da infância até os primeiros passos no esporte, já adulto.

“Eu tive poliomielite com seis meses de idade. Morava em Cícero Dantas, no interior da Bahia. Meu pai trabalhava de vigilante e minha mãe trabalhava em uma clínica. Eu só comecei a andar com 5 anos, porque o recurso era muito difícil e minha família era pobre. Para fazer uma cirurgia depois que eu tive a pólio foi difícil”, narrou.

Em dois momentos marcantes: força para levantar a barra e carinho do treinador Valdecir Lopes, que o apoiou em toda a caminhada até o pódio do Rio 2016. Fotos: Cezar Loureiro/MPIX/CPB

“Aí consegui a cirurgia, comecei a andar e foi muito difícil isso também. Na escola todo mundo jogava bola. Tinha as competições de escola, entre os colégios, e eu nunca pude participar e ganhar medalha. Era o meu sonho ter uma medalha. E eu só fui ganhar minha primeira co m 23 anos, em uma competição com atletas que não têm deficiência, já que participo dos dois. Foi em 2008, em Ribeirão Pires, um campeonato paulista de supino convencional. E na primeira competição já fiquei em terceiro lugar. Aquela foi minha primeira medalha e meu primeiro sonho realizado”, prosseguiu Evânio, que contou ainda com o halterofilismo entrou em sua vida.

“Eu comecei a praticar musculação lá na Bahia ainda. Eu tinha feito uma cirurgia na perna, porque minha perna era muito curta. Aí tive que fazer alongamento na perna e comecei a musculação para o fortalecimento da perna. Eu tinha 18 anos quando fiz a cirurgia, depois que parei de crescer. Minha perna não cresceu como a outra. Eu não tinha recurso para fazer fisioterapia e eu fui crescendo e minha perna não foi acompanhando. Ai eu fiz a cirurgia para corrigir. Quando eu terminei a cirurgia em Salvador e tirei os ferros da perna eu comecei na academia, mas só para fortalecer a perna para começar a andar de novo”, lembrou.

“No começo eu não conseguia levantar nenhuma barra. Mas fui melhorando, melhorando... Aí teve uma competição em Cicero Dantas, depois da cirurgia em Salvador, e eu fui evoluindo e comecei a tomar gosto pela musculação. Meu irmão me convidou para morar na Praia Grande, no interior de São Paulo, para procurar emprego. Fiquei dois anos até que um colega que tinha deficiência e que competia nas provas de halterofilismo me mostrou o esporte. Aí em 2010 eu comecei no esporte paraolímpico”.

Luiz Roberto Magalhães – brasil2016.gov.br