Tenis de mesa
Cochabamba 2018
Com 'força do além', tênis de mesa leva seis dos sete ouros
Há uma história simplista da participação do tênis de mesa brasileiro em Cochabamba, na Bolívia. Ela termina com seis ouros conquistados em sete possíveis. O único ouro que não veio virou um bronze na dupla masculina. Uma trajetória descrita em números que deixa clara a preservação da hegemonia do país no continente.
É uma história correta, mas incompleta. A visão mais ampla enxerga um trabalho frequente de fisioterapeutas e equipe médica na arquibancada do Coliseu Evo Morales, palco da modalidade, e na Vila dos Atletas. Uma ação para relaxar tendões, aplicar gelo em musculaturas inflamadas e ajudar na respiração dos atletas com cilindros de oxigênio.
Bruna Takahashi, por exemplo, sai dos Jogos Sul-Americanos como uma das principais multimedalhistas. Foram quatro ouros em quatro possíveis. O último deles na chave de simples, numa final brasileira contra Lin Gui, nesta quinta-feira (07.06). Mas a Bruna da final já era um arremedo da atleta de 17 anos. Estava lá com o restinho do que tinha conseguido guardar de energia. Para compensar o cansaço e as múltiplas dores musculares, vibrou a cada ponto na vitória por 4 sets a 2 (7/11, 11/7, 11/4, 8/11, 11/8 e 11/5).
"Olha, eu estou cheia de dores, exausta mesmo. Ontem joguei 32 sets entre partidas individuais e de duplas. Então, sinto que me superei de verdade. Consegui me desafiar. Vibrei muito nessa final para tirar de mim o que restava"
Bruna Takahashi
"Olha, eu estou cheia de dores, exausta mesmo. Ontem joguei 32 sets entre partidas individuais e de duplas. Então, sinto que me superei de verdade. Consegui me desafiar. Vibrei muito nessa final para tirar de mim o que restava", afirmou Bruna. Segundo ela, as fortes dores no ombro direito são decorrentes de uma mudança de movimentação para adaptar o corpo à altitude.
"Aqui a bola pinga mais alto para a gente. Aí, dependendo da situação, a gente é obrigado a fazer um movimento diferente do que estamos acostumados. Acaba ficando um movimento errado feito repetidas vezes. Inflama. Vou tratar direitinho quando voltar ao Brasil, mas não tenho dúvidas de que todo esse esforço valeu a pena", disse a atleta.
Lin Gui, a adversária de Bruna na final, foi o retrato desse esforço a mais. Em hora alguma ela se sentiu confortável na altitude de 2.500m da cidade boliviana. Em quase todos os intervalos de jogo fazia uso do cilindro de oxigênio. Sentiu tonturas, dores de cabeça, precisou ir ao banheiro no meio de jogos. Mas lutou. Volta para o Brasil com a prata individual e o ouro por equipes. "Não consegui fazer meu melhor, mas sabia que teria de lutar sempre", afirmou a atleta.
Para o técnico da seleção brasileira feminina, Hugo Hoyama, a participação nacional foi ainda mais expressiva em função dessas condições. "Melhor resultado, impossível. Nós, assim como muitos outros, precisamos superar adversidades, mas soubemos ser mais competentes mentalmente nos momentos principais. Foi um trabalho de equipe excelente e que nos permite voltar motivados para outras competições, em especial o Pan do ano que vem, em Lima, e, quem sabe, os Jogos Olímpicos de Tóquio, em 2020.
Guerreiro
"Não sei nem o que falar. É um sonho se realizando. Para mim, sempre foi uma meta representar o Brasil em alguma edição de Jogos. Todos as partidas foram muito difíceis, equilibradas, com decisão em alguns pontos precisos. Acho que isso me fez forte mentalmente"
Vitor Ishiy
Vitor Ishiy especializou-se em reações heróicas durante sua jornada nos Jogos Sul-Americanos. Teve força mental para salvar jogos praticamente perdidos. Na semifinal por equipes, protagonizou o último e decisivo duelo da série contra a Argentina. Diante do experiente Pablo Tabachnik, de 40 anos, travou uma batalha em cinco sets decidida pela diferença mínima após salvar um match point.
Na semifinal individual em melhor de sete, perdia por 3 sets a 1 para o chileno Gustavo Gómez e teve forças para virar a partida para 4 sets a 3. Na decisão, batalha em seis sets em que superou outro chileno, Juan Lamadrid, por 4 sets a 2 (11/6, 11/6, 6/11, 9/11, 11/6 e 11/7) num duelo mental. Vitor abriu 2 sets a 0, mas o chileno empatou em 2 x 2. O quinto game foi igual até 4 x 4, quando Vitor abriu vantagem e caminhou para o título.
"Não sei nem o que falar. É um sonho se realizando. Para mim, sempre foi uma meta representar o Brasil em alguma edição de Jogos. Todos as partidas foram muito difíceis, equilibradas, com decisão em alguns pontos precisos. Acho que isso me fez forte durante a competição, me fortaleceu mentalmente. Foi o diferencial", celebrou o atleta de 21 anos, que alterna treinos em São Caetano com períodos na Alemanha, no Ochsenhausen. O clube é o mesmo de Hugo Calderano, brasileiro que ocupa a décima primeira posição no ranking mundial.
Francisco Arado, técnico da seleção brasileira masculina, respirou mais aliviado ao fim da competição. Ele, mais do que ninguém, sabe a distância entre os números finais da campanha brasileira e o processo que permitiu chegar até lá. "Quem vê só o resultado não tem ideia do equilíbrio, da dificuldade que é manter essa hegemonia. Foi muito bom ver os jovens jogadores do Brasil mostrar que podem e que conseguem ganhar o título de equipe e individual. Mostramos a imagem do que é esse time do Brasil", disse.
O próximo desafio da seleção brasileira é a Copa Pan-Americana de tênis de mesa, que será disputada em Assunção, no Paraguai, de 15 a 17 de junho. O torneio reúne os 16 melhores atletas do continente e vale vagas para a Copa do Mundo individual. Nesse torneio, no masculino, o Brasil volta a ser representado por seus titulares, Hugo Calderano e Gustavo Tsuboi.
Confira galeria de fotos das finais individuais do tênis de mesa. Imagens disponíveis para download em alta resolução (uso editorial gratuito)
Gustavo Cunha, de Cochabamba, na Bolívia - rededoesporte.gov.br