Brasil chega à marca de 100 medalhas de ouro na história dos Jogos Paralímpicos

Yeltsin Jacques bate o recorde mundial nos 1.500m da Classe T11 e decreta a centésima vez que o Hino Nacional brasileiro é entoado na história do megaevento esportivo

Quando Yeltsin Jacques e seu guia Carlos Antonio dos Santos cruzaram a linha de chegada na prova dos 1.500m da classe T11, na manhã desta terça no Japão (noite de segunda no Brasil), o tempo de 3min5760 decretou mais do que o recorde mundial da distãncia, o segundo ouro do atleta de Campo Grande e a décima terceira medalha de ouro do Brasil nos Jogos de Tóquio. O título de Yeltsin no Estádio Olímpico representou a centésima vez que um atleta paralímpico do Brasil levou o país ao topo do pódio na história do megaevento.

"Eu fiquei sabendo que havia essa chance hoje cedo e sempre fui muito patriota. Desde a época da escola gostava de formação para cantar o hino. Para mim é mais uma honra ter conquistado essa medalha. Corri não pelo recorde, mas pela medalha, para ajudar o Brasil no quadro de medalhas, para ter mais uma vez a honra de ter o Hino Nacional no Pódio", comentou o atleta, que já havia conquistado o título dos 5.000 metros e que ainda correrá a maratona.

: Foto: Helano Stuckert/ rededoesporte.gov.br

"A gente saiu do quarto pela manhã pensando em ganhar a medalha. Tinha em mente fazer a passagem em 64 segundos, e com isso daria para bater o recorde. Nos últimos 100 metros, o Bira falou para segurar que iria dar recorde", comemorou o atleta, que pode ampliar o número de medalhas. Ele ainda vai disputar a maratona na noite (no Brasil) do dia 4.

A conquista de Yeltsin remete a uma trajetória que teve início há 37 anos, na edição dos Jogos compartilhada entre Nova Iorque e Stoke Mandeville, em 1984. Foi lá que o Brasil subiu ao topo do pódio em Jogos Paralímpicos pela primeira vez, com sete conquistas, a primeira delas com Márcia Malsar, nos 200m da classe C6 do atletismo,

"Eu fiquei sabendo que havia essa chance hoje cedo e sempre fui muito patriota. Desde a época da escola gostava de formação para cantar o hino. Para mim é mais uma honra ter conquistado essa medalha. Corri não pelo recorde, mas pela medalha, para ajudar o Brasil no quadro de medalhas, para ter mais uma vez a honra de ter o Hino Nacional no Pódio"

Yeltsin Jacques

De lá para cá, o esporte paralímpico foi gradativamente se profissionalizando. Desde a edição de Pequim, em 2008, o Brasil frequenta de forma assídua o top ten das nações com maior destaque no principal evento esportivo do cenário internacional para atletas paralímpicos e já está entre os 20 países com mais medalhas acumuladas na história.

Somando o pódio de Yeltsin Jacques, o Brasil já conquistou 336 medalhas na história dos Jogos Paralímpicos. São 100 medalhas de ouro, 119 de prata e 117 de bronze. Na capital japonesa, são 13 de ouro, oito de prata e 15 de bronze: 35 pódios.

Carros-chefe

O atletismo e a natação são as modalidades que historicamente puxam o desempenho do país em busca desses 100 ouros, até por concentrarem o maior número de possibilidades de medalhas individuais em suas dezenas de provas. Mas também entram nessa conta o judô, a bocha, a esgrima e o halterofilismo e o futebol de cinco.

No atletismo são 46 ouros conquistados, com alguns destaques históricos no período, como Ádria dos Santos, pioneira nas provas de velocidade para pessoas com deficiência visual. Ela representou o Brasil entre os Jogos de Seul 1988 e Pequim 2008, e conquistou quatro medalhas de ouro em um total de 13 pódios. Outros nomes, como Antônio Delfino, Terezinha Guilhermina, Shirlene Coelho, Yohansson Nascimento, Daniel Martins e Petrúcio Ferreira são "tijolinhos" que ajudam a construir essa trajetória.

: Nenhum atleta contribui tanto individualmente para os 100 ouros quanto Daniel Dias: 14 vezes no topo do pódio desde os Jogos de Pequim, em 2008. Foto: CPB

Daniel, força de uma nação

“Fico feliz demais de contribuir para essa história e de encerrar essa trajetória em Tóquio, de vivenciar esse momento, de aproveitar, de me divertir. Sempre entreguei o meu melhor"

Daniel Dias

A natação é a segunda modalidade com o maior número de ouros registrados na história. São 37 oportunidades em que o Hino Nacional tocou com a bandeira brasileira hasteada no ponto central do pódio. Ninguém protagonizou mais essa sensação do que o paulista Daniel Dias. Entre os Jogos de Pequim 2008 e Tóquio 2021, eles conquistou 14 medalhas de ouro, 37,8% de todos os ouros da história da natação brasileira.

Em Tóquio, Daniel já anunciou que fará sua despedida das piscinas. Para não perder o costume, já subiu ao pódio para receber a medalha de bronze em três oportunidades em Tóquio: nos 100m, 200m da classe S5 e no revezamento 4 x 50m misto 20 pontos. “Fico feliz demais de contribuir para essa história e de encerrar essa trajetória em Tóquio, de vivenciar esse momento, de aproveitar, de me divertir. Sempre entreguei o meu melhor", disse Daniel.

Outro ídolo de imenso patamar nas piscinas é Clodoaldo Silva, dono de cinco ouros individuais e um em revezamento numa única edição de Jogos Paralímpicos, feito conquistado em Atenas (2004). André Brasil também é protagonista na lista, com sete ouros entre 2008 e 2012. Outros nomes históricos são Fabiana Sujimori (2000) e Maria Carolina Santiago, que incluiu agora seu nome na lista com a vitória nos 50m livre em Tóquio, com direito a recorde paralímpico: 26s82.

: Ádria dos Santos, a maior medalhista no feminino. Antônio Tenório, quatro ouros no judô. Mariana D'Andrea, a primeira medalhista de ouro do halterofilismo. Equipe da bocha nos Jogos Rio 2016, modalidade que já rendeu seis ouros. O futebol de cinco, imbatível desde 2004. Jovane Guissone, ouro em 2012 na esgrima, e André Brasil, dono de sete ouros na natação.

Quatro vezes Tenório

O judô é outra modalidade de contribuição importante para os 100 ouros. São cinco no esporte, que sobe ao pódio dos Jogos Paralímpicos de forma ininterrupta desde a edição de Atlanta, em 1996. O principal nome dessa trajetória é Antônio Tenório, tetracampeão de forma consecutiva entre Atlanta (1996) e Pequim (2008). Em Tóquio, Alana Maldonado acrescentou um nome feminino a essa lista ao vencer a categoria -70kg.

100% de aproveitamento

Nenhuma outra modalidade, contudo, tem um aproveitamento tão perfeito quanto o futebol de cinco. Desde que o esporte para atletas com deficiência visual passou a fazer parte do programa dos Jogos Paralímpicos, em 2004, 100% dos ouros ficaram com o Brasil.

A bocha contribuiu com seis ouros, o mais recente deles conquistado com participação da porta-bandeira do Brasil na cerimônia de abertura em Tóquio, Evelyn de Oliveira. As outras modalidades que integram a lista são a esgrima, com o ouro conquistado por Jovane Guissone na espada nos Jogos de Londres, e o halterofilismo, que passou a entrar no “mapa do ouro” nacional com a conquista em Tóquio de Mariana D’Andrea, que levantou 137 quilos na disputada da categoria -73kg.

Investimento

Um dos pilares que sustenta a evolução do esporte paralímpico no país é a certeza de recursos recorrentes para a gestão da estrutura esportiva e para a manutenção dos atletas 100% conectados ao alto rendimento.

A delegação brasileira que atua no Japão, por exemplo, é respaldada por um investimento total de R$ 117 milhões do Governo Federal via Bolsa Atleta. Esse é o valor repassado historicamente, desde 2005, a 226 esportistas (95,7% da delegação) do grupo de 236 titulares do Brasil presentes na capital japonesa.

Só no ciclo entre os Jogos Rio 2016 e Tóquio 2021, são R$ 75 milhões investidos diretamente nos integrantes do elenco nacional pelo programa da Secretaria Especial do Esporte do Ministério da Cidadania. Em 15 das 20 modalidades em que o Brasil tem representantes nas competições que seguem até 5 de setembro, 100% dos atletas fazem parte do programa.

Outros suportes

Apenas neste ciclo entre 2016 e 2021, a Lei de Incentivo ao Esporte (LIE) do Ministério da Cidadania teve 699 projetos voltados ao alto rendimento aprovados para captação de recursos. O valor captado no período superou os R$ 640 milhões, muitos deles voltados para o esporte paralímpico.

Outro importante aporte garantido ao esporte paralímpico é realizado pela Lei de Loterias. Só em 2020, foram destinados R$ 163,1 milhões ao Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) diretamente, a partir de um percentual que sai das apostas feitas pelos brasileiros.

Estrutura Esportiva

A delegação paralímpica brasileira também chega à centésima medalha com um salto de qualidade na estrutura esportiva de treinamento de alto rendimento. No ciclo entre os Jogos Rio 2016 e Tóquio 2021, os atletas do país passaram a contar de forma integral com os recursos de ponta oferecidos pelo Centro de Treinamento Paralímpico de São Paulo.

O complexo é uma referência mundial e o principal centro de excelência da América Latina. A instalação, sob gestão do Comitê Paralímpico Brasileiro, recebeu R$ 187 milhões do Governo Federal, sendo R$ 167 milhões na construção e outros R$ 20 milhões em equipagem, e foi concluído antes dos Jogos Rio 2016.

O local tem capacidade para receber mais de 200 atletas simultaneamente e estrutura para treinamentos e competições de 15 modalidades: atletismo, basquete em cadeira de rodas, bocha, natação, esgrima em cadeira de rodas, futebol de 5, futebol de 7, goalball, halterofilismo, judô, rúgbi em cadeira de rodas, tênis de mesa, tênis em cadeira de rodas, triatlo e vôlei sentado.

DIVISÃO DOS OUROS BRASILEIROS POR EDIÇÃO

1984 - Nova Iorque / Stoke Mandeville
Ouros: 7
Classificação do Brasil: 24º lugar